Contra o nacional-comunismo
(as lições do plebiscito ''vermelho'')

Leon Trotsky


Como tudo está pelo avesso


Quando estas linhas serão conhecidas dos leitores, elas terão talvez envelhecido em certas partes. Graças aos esforços do aparelho estalinista e com o apoio amigável de todos os governos burgueses, o autor destas linhas está colocado em tais condições que ele não pode reagir aos acontecimentos políticos senão com um atraso de algumas semanas. A isso, ainda é preciso acrescentar que o autor é obrigado a apoiar-se sobre uma informação que está longe de ser completa. O leitor deve ter conta disso. Mas é preciso tentar tirar, mesmo duma situação pouco cómoda, algumas vantagens. Não tendo a possibilidade de reagir aos acontecimentos no dia a dia, em todo os seus aspectos concretos, o autor é obrigado a concentrar a sua atenção sobre os pontos fundamentais e sobre as questões cruciais. Aí está a justificação do presente trabalho.

Como tudo se meteu pelo avesso.

Os erros do P. C. alemão na questão do plebiscito pertencem à categoria desses erros que se tornam cada vez mais evidentes e que entrarão definitivamente nos manuais da estratégia revolucionária como exemplos do que não se deve fazer.

Na atitude do Comité central do P. C. alemão, tudo é errado: a apreciação da situação é falsa, o objectivo imediato é colocado de uma maneira falsa, os meios escolhidos para o atingir são falsos. Assim, a direcção do Partido arranjou-se de maneira a derrubar todos os «princípios» que ela defendia durante os últimos anos.

A 21 de Julho, o C. C. dirigiu-se ao governo prussiano com reivindicações democráticas e sociais, ameaçando, em caso de recusa, de tomar a defesa do referendo. Avançando essas reivindicações, a burocracia estalinista dirigiu-se efectivamente à cúpula do Partido social-democrata com proposições, sob certas condições, da frente única contra o fascismo. Depois da social-democracia ter rejeitado essas condições, os estalinistas fizeram frente única com os fascistas contra a social-democracia. A política da frente única se faz portanto não somente «por baixo», mas também por «cima». Foi permitido a Thaelmann de dirigir-se a Braun e a Severing por uma «carta aberta» para a defesa comum da democracia e da legislação social contra os bandos de Hitler. Assim, essa gente, sem se aperceber, demoliram toda a sua metafísica da frente única «só por baixo» com a ajuda da experiência a mais incapaz e a mais escandalosa da frente única só pelo alto, experiência inesperada para as massas e contrária à vontade das massas.

Se a social-democracia representa uma variedade de fascismo, como se pode apresentar aos sociais-fascistas um pedido oficial de defesa comum da democracia? Ao tomar o caminho do referendo, a burocracia do partido não colocou qualquer condição aos nacionais-socialistas. Porquê? Se os sociais-democratas e os nacionais-socialistas só representam nuanças do fascismo, porquê se pode colocar condições à social-democracia e não se pode colocá-las aos nacionais-socialistas? É porque existe algumas diferenças importantes de qualidade entre essas duas «variedades», tanto no que respeita seus métodos de enganar as massas? Então não chamem fascistas a uns e a outros, porque os termos, em política, servem para distinguir as coisas e não para meter tudo dentro do mesmo saco.

Todavia é justo dizer que Thaelmann concluiu uma frente única com Hitler? A burocracia comunista deu ao referendo de Thaelmann o nome de «vermelho», em oposição ao plebiscito negro ou castanho de Hitler. Está evidentemente fora de dúvida que se trata de dois partidos inimigos irredutíveis, e todas as mentiras da social-democracia não chegarão a se fazerem esquecer aos operários. Mas o facto está aí: numa determinada campanha, a burocracia estalinista arrasta os operários revolucionários numa frente única com os nacionais socialistas contra a social-democracia. Se, pelo menos, se pudesse marcar sobre o boletim de voto o nome do partido ao qual pertence o eleitor, o referendo teria tido esta justificação (politicamente completamente insuficiente no caso dado) em permitir contar suas forças e pelo mesmo jeito, de se diferenciar das forças do fascismo. Mas a «democracia» burguesa não teve o cuidado, a moda de Weimar, de assegurar o direito aos partidários do referendo, de marcar o nome do deu partido. Todos os eleitores misturam-se indistintamente na massa que dá à determinada questão, a frente única com os fascistas é de facto incontestável.

Assim, de um dia para o outro, tudo ficou pelo avesso.


Inclusão 14/05/2017