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«O Futebol Clube de Barcouço equipa de azul e branco. Teve uma primeira fase com essa malta que terá agora os seus 50 anos, 50 e pico. Foram esses que começaram cá com o clube na terra. Depois veio a acabar nos tempos em que eu já era rapazote. Eles traziam cá equipas e como não tinham cá malta com jeito para a bola, convidavam a, b, c ou d. Jogou aqui muito jogador com nomeada. Um deles foi aquele Carvalho que jogou no F. C. do Porto. Viu-o aqui jogar muita vez. Quer dizer: eles faziam muita despesa, não se aguentaram e empenharam aquilo tudo ali, na pensão de Santa Luzia. A mulherzinha tomou conta de tudo. Só nos sucedeu aquilo já eu era rapazote; devia ter uns 15 ou 16 anos quando nós fomos desempenhar aquilo para continuar e começar a jogar. Eram os equipamentos, as botas e uma bola; estava tudo no prego. A mulherzita, é a mãe do Ramos, ficou lá com aquilo porque eles não lhe pagavam. Deviam-lhe uns 600 e tal escudos e naquele tempo, já lá vão uns 25 ou 30 anos, era muito dinheiro. A malta arranjou o dinheirito, desempenhou aquilo e começaram outra vez a jogar. Então formou-se uma segunda equipa que foi talvez a melhor de todas que houve em Barcouço. Eles principiaram e eu era ainda bastante novo. Nessa altura ainda não tinha hipótese de jogar porque eu era muito magrito, muito franzininho. Quando atingi ali os 16, 17 anos então comecei a jogar e essa talvez fosse a melhor equipa até hoje. Nestas freguesias ao redor, até em concelhos, até em equipas distritais nós chegámos a jogar com elas taco a taco sem problema: e a batê-las às vezes de que maneira.
Os anos foram passando: uns cumpriam a vida militar, abriram os olhos para a vida e já não podiam voltar aqui aos tempozitos de apertar cinto; cada vez mais começou a ir um para cada lado; uns emigram; outros para a polícia; outros casam. A equipa começou a oscilar: não se metiá malta nova para ir continuando o trabalho. Veio desinteresse, porque não havia jogadores. Até que há uns dez anos para cá apareceram estes rapazes novos: a maioria deles eram estudantes e têm tido uma equipa mais ou menos regular. As vezes é assim uma equipazinha mesmo muito jeitosa.
Foi só o ano passado, depois do 25 de Abril que se pensou em fazer umas instalações que não fossem só para o futebol. Queríamos ter secções de atletismo, volei, andebol, basquetebol. Temos lá um recintozinho para fazer um campo para esses desportos. Pedimos pelo povo dinheiro para as obras do campo. E o povo deu boas ofertas. Organizámos também festas. Com a ajuda de pessoas amigas conseguimos trazer cá o União de Coimbra no dia de Páscoa. Deu-nos muito trabalho para conseguir cobrir o festival todo: os membros da direcção e os jogadores ajudaram a ir buscar e levar os jogadores do União. Oferecemos uma merendazinha porque eles vieram cá completamente à borla. Recrutámos um jogador de cada equipa aqui da zona das que disputavam o campeonato popular da Bairrada. Depois o União de Coimbra fez-nos outro tanto favor: mandou cá a sua equipa feminina. Também foi um dia grande para o Barcouço. O jogo com uma equipa feminina era uma coisa rara aqui na zona. Jogou contra a equipa do Serpins, da Bair- rada. Tudo à borla, simplesmente nós dapois demos-lhe uma gratificação para cobrir as despesas que eles fizeram.
O Ançã também nos mandou cá a equipa principal que ganhou o campeonato da I Divisão Distrital de Coimbra. Outro dia grande, e assim conseguimos arranjar muito dinheiro.
Barcouço não é uma terra grande e já este ano em melhoramentos do campo gastámos 140 contos. Só em terraplanagens gastámos à volta de 60 contos. O campo é alugado; no primeiro ano pagámos quatro mil escudos, agora decidimos dar cinco contos por ano. As pessoas cederam o terreno com muita vontade de ajudar.
O clube tem 200 e tal associados, e a quota mínima obrigatória é de 10800 por mês.
Os jogadores são todos amadores. Presentemente juniores ou seniores alinham todos na mes ma equipa: o jogador mais novo tem quinze anos e o mais velho trinta. Eu fui escolhido pela maioria dos jogadores para orientá-los. Não conheço nada de táctica de futebol: sou um amparo que está ali a dizer façam isto ou aquilo. Não sou treinador. Nós fomos para o campeonato popular sem obrigação de ganharmos o campeonato. Fomos lá pará competir e levar o nome de Barcouço às outras terras; pôr a malta mais nova à jogar porque nós inscrevemos 22 jogadores e aquilo dava para todos, Praticamente nunca treinamos. Antes do campeonato só umas duas sessões orientadas pela comissão de jogadores eleita entre eles. Eram rapazes mais evoluídos que tinham treinado em clubes. Sabiam exercícios de preparação física. Com as sessões progrediram bastante; eram muito puxadas, Alguns chegavam ao fim e vinham de gatas para casa. Na equipa é tudo malta que trabalha: funcionários dos correios, da caixa de previdência, pedreiros e uns três que estão na agricultura. Há dois ou três estudantes. No meu tempo a equipa erá praticamente constituída por onze agricultores. Não há prémios de jogos.
Temos massagista: é um rapaz que seguia sempre com eles. Havia dois enfermeiros que nos ajudavam. O roupeiro? São os próprios jogadores; Pagamos a uma rapariga para lavar os equipa mentos.
O clube compra os equipamentos. Se um jogador ou outro gosta de ter umas botas melhores e se tem dinheiro para isso compra-as ele. O clube não compra botas de propósito para ninguém. Compra quatro ou cinco botas do mais barato que houver. Não há privilegiados.
A ideia da equipa de futebol feminino veio depois de se verificar que noutras terras da Bairrada já tinham dessas equipas. Era engraçado: chama a atenção de muita gente que vinha ver os jogos. Começaram depois de ver o jogo entre o União e o Serpins. De facto, o União apresentou aí meia dúzia de raparigas que faziam inveja a jogar a certos homens. O povo ficou entusiasmado; as mulheres gostam de ver. Há cá umas catorze raparigas a jogar actualmente. Quem orienta é um homem da equipa do meu tempo.
Além do futebol o clube não tem mais nada a funcionar. Falta a instalação para os outros desportos... Há malta na direcção que só pensa no futebol. Somos onze elementos na direcção. Foi uma lista única; não achei muito bem, mas como era para trabalhar em grupo foi melhor assim. Podiam aparecer tipos com quem não nos entendessemos, e criavam-se complicações.
Para uma terra como Barcouço que já tem muita juventude não se pode de maneira nenhuma fazer só um campo de futebol para jogarem onze pessoas. Fizemos um projecto para todas as modalidades. Foi feito por um rapaz da direcção que é desenhador. Mandámos para todas as entidade oficiais do país, e recebemos um subsídio da Direcção Geral dos Desportos de trinta contos, e quinze contos do Governador Civil de Aveiro. Nesse projecto ia o campo de futebol, cabinas, um campo para vários desportos, e uma pista para atletismo. Calculamos que eram necessários 400 contos. Os 45 de subsídio não chegavam. Fizemos a terraplanagem, muros, cabinas. Muita gente lá trabalhou de borla, e mesmo assim gastámos 140 contos. A comissão administrativa da Junta não deu nada, embora pro metesse.
A maioria da gente do futebol também é da cooperativa. O parque desportivo chama-se Parque do POVO. A cooperativa pediu-nos o campo para receber o tractor da Lisnave e cedemos; o GDUP pediu o campo para um jogo e cedemos; os professores pediram o campo para os miúdos da escola e nós cedemos.
Vamos lançar uma campanha para angariação dos sacos de cimento para fazer o piso do campo de basquetebol.
Queremos pôr toda a juventude de Barcouço a praticar desporto.»
Inclusão | 14/06/2019 |