MIA> Biblioteca> Miguel Urbano Rodrigues > Novidades
Primeira Edição: ODiario.info - http://www.odiario.info/?p=2516
Fonte: http://resistir.info
Transcriçãoe HTML: Fernando Araújo.
A compreensão pelos povos da estratégia exterminista do imperialismo que os ameaça é extremamente dificultada pela ignorância sobre o funcionamento do sistema de poder dos Estados Unidos e pela imagem falsa que prevalece a respeito da sociedade norte-americana não apenas na Europa mas em muitos países subdesenvolvidos.
Repetir evidências passou a ser uma necessidade no combate à alienação das grandes maiorias, confundidas e manipuladas pelos responsáveis da crise de civilização que atinge a humanidade.
Talvez nunca antes a insistência em iluminar o óbvio oculto tenha sido tão importante e urgente porque a falsificação da História e a manipulação das massas empurra a humanidade para o abismo.
Essa tarefa assume um carácter revolucionário porque as forças que controlam o capitalismo utilizam as engrenagens do sistema mediático para criar uma realidade virtual que actua como arma decisiva para a formação de uma consciência social passiva, para a robotização do homem.
A compreensão pelos povos da estratégia exterminista do imperialismo que os ameaça é extremamente dificultada pela ignorância sobre o funcionamento do sistema de poder dos Estados Unidos e a imagem falsa que prevalece a respeito da sociedade norte-americana não apenas na Europa mas em muitos países subdesenvolvidos.
Não obstante serem inocultáveis os crimes cometidos pelos EUA nas últimas décadas em guerras de agressão contra diferentes povos, uma grande parte da humanidade continua a ver na pátria de Jefferson e Lincoln uma terra de liberdade e progresso. O mito romântico dos pioneiros do Mayflower é difundido por uma propaganda perversa que insiste em apresentar o povo e o governo dos EUA como vocacionados para defender e liderar a humanidade. Os males do capitalismo seriam circunstanciais e a grande república, presidida agora por um humanista, estaria prestes a superar a crise que a partir dela alastrou pelo mundo.
Não basta afirmar que estamos perante uma perigosa mentira. Desmontar o mito estado-unidense é, repito, uma tarefa prioritária na luta contra a alienação das maiorias. O político negro cuja eleição desencadeou uma vaga de esperança entre oprimidos da Terra engavetou os compromissos assumidos com o povo e ao longo do seu mandato deu continuidade a uma estratégia de dominação mundial, ampliando-a perigosamente.
Diferentemente de Bush júnior, Obama soube construir uma máscara de estadista sereno e progressista. A sua reeleição, não tenhamos dúvidas, será facilitada porque o candidato republicano que o enfrentará, Mitt Romney, é um político ultra reaccionário, sem carisma.
No Iraque a violência tornou-se endémica, milhares de mercenários substituíram as tropas de combate e um governo fantoche actua como instrumento das transnacionais do petróleo.
No Afeganistão a guerra está perdida. Após onze anos de ocupação, as forças da NATO e as dos EUA somente controlam Cabul e algumas capitais de província. Todas as ofensivas contra a Resistência (que vai muito alem dos Talibãs) fracassaram e nos quartéis e nos Ministérios os recrutas matam com frequência os instrutores estrangeiros, americanos e europeus.
A retirada antecipada das tropas francesas do país colocou um problema inesperado ao Pentágono. Em Washington poucos acreditam que o presidente cumpra o acordo sobre a evacuação do exército de ocupação antes do final de 2014.
Em declarações recentes, Obama, já em campanha eleitoral, retomou o tema da defesa dos "interesses dos EUA no mundo". Essa política implica a existência de centenas de bases militares em mais de uma dezena de países. Na Colômbia, por exemplo, foram instaladas mais oito.
Numa inflexão estratégica, o presidente informou que está em curso uma deslocação para Oriente do poder militar norte-americano. O secretário da Defesa esclareceu que dois terços da US Navy serão deslocados para o Pacifico. Ficou transparente que o objectivo inconfessado é cercar por terra e mar a Rússia e a China.
Vladimir Putin interpretou correctamente a mensagem. Consciente de que na sua escalada agressiva os EUA teriam de reforçar a sua hegemonia no Médio Oriente, abatendo o Irão, antes de definirem aqueles países como "inimigos" potenciais, o presidente russo num discurso firme advertiu Washington de que está a ultrapassar a linha vermelha.
Contrariamente ao que afirmam alguns analistas que cultivam o sensacionalismo, a iminência de uma terceira guerra mundial é, porém, uma improbabilidade. Mas isso graças à firmeza da Rússia. Putin não esqueceu Munique. Usou palavras duras, recordando a agressão ao povo líbio, para lembrar a Obama que já foi longe demais e que não tolerará uma intervenção militar USA — União Europeia na Síria, qualquer que seja o pretexto invocado.
O belicismo de Obama é, alias, tão ostensivo que até um jornal do establishment, o New York Times (que o tem apoiado), sentiu a necessidade de revelar que a lista de "terroristas" e dirigentes políticos a aniquilar pelos aviões sem piloto (os famosos drone) é submetida à aprovação do chefe da Casa Branca. Matar a longa distância, numa guerra electrónica de novo tipo, tornou-se uma rotina graças aos progressos da ciência. Leon Panetta, o actual secretário da Defesa, não somente a aprova como a elogia, assim como o general Petraeus, o director da CIA.
O prémio Nobel Obama aprova previamente os alvos humanos seleccionados cujas biografias lhe são enviadas . A esse nível se situa hoje o seu conceito de ética.
Os homens do presidente chegaram à conclusão de que essa modalidade de assassínio não tem suscitado grandes protestos internacionais e evita a perda de pilotos.
O principal inconveniente é a imprecisão desses ataques. No Paquistão, dezenas de aldeões foram mortos em bombardeamentos dos drones nas áreas tribais da fronteira afegã. O erro (assim lhe chamam no Pentágono) gerou uma crise nas relações com o Paquistão quando 26 soldados daquele país foram abatidos por um avião assassino. O governo de Islamabad proibiu a partir de então a travessia da fronteira pelos caminhões que carregam alimentos e armas para as tropas dos EUA e da NATO.
Não obstante os "inevitáveis danos colaterais", os generais do Pentágono definem como revolucionária a guerra barata na qual basta carregar num botão, por vezes a centenas de quilómetros de distância, para atingir alvos humanos seleccionados em gabinetes nos EUA e aprovados pelo Presidente.
A esmagadora maioria dos estado-unidenses tem um conhecimento muito superficial do que se passa nas guerras asiáticas do seu país. Mas no Exército alastra um difuso mal-estar. No ano corrente registou-se um record de suicídios de militares.
São qualificados de especialmente satisfatórios os bombardeamentos frequentes a tribos "terroristas" do Iémen e da Somália. Se a CIA informa que uma tribo perdida nas montanhas da outrora chamada Arábia Feliz é acusada de ligações suspeitas com a Al Qaeda, envia-se um drone da base de Djibuti para liquidar o seu chefe. Obama dá o seu aval à operação.
O New York Times, no editorial citado, reconhece com pesar que o actual poder decisório presidencial de assassinar "terroristas" em regiões remotas "não tem precedentes na história presidencial". Monstruoso, mas real: Obama comporta-se como um ciber-guerreiro.
Nessa estratégia criminosa, a invocação da Al Qaeda como a grande ameaça à segurança dos EUA é permanente, obsessiva.
Somente em Março pp. o Google registou 183 milhões de entradas em busca de informações sobre a organização.
Os EUA planearam e executaram a morte de Ben Laden numa operação obscura de forças especiais, violadora da soberania do Paquistão. Mataram já ou afirmam ter assassinado os principais dirigentes da Al Qaeda. Mas o fantasma da Al Qaeda sobreviveu, e é esse dragão, invisível, medonho, que motiva os bombardeamentos dos drones, a guerra electrónica assassina.
O mito da Al Qaeda, o inimigo número 1, tornou-se um pilar da estratégia "anti-terrorismo" dos EUA.
Quantas pessoas, mundo afora, sabem que Ben Laden foi um aliado íntimo dos EUA durante a guerra contra a Revolução Afegã? Poucas.
E poucas são também as que têm conhecimento das relações estreitas que a CIA e a inteligência militar dos EUA mantiveram e mantêm com organizações fundamentalistas islâmicas.
A necessidade de aniquilar a Al Qaeda foi o argumento básico que Bush filho brandiu para justificar o Patriot Act e a invasão e ocupação do Afeganistão, numa cruzada "antiterrorista" em defesa "da liberdade, da democracia, da paz "
Obama, usando um discurso diferente, muito mais hábil, aprofundou a estratégia de poder dos EUA.
Ao assinar a lei da Autorização da Segurança Nacional, o presidente dos EUA tripudiou sobre a Constituição, transformando o país num Estado militarizado que exibe uma fachada democrática. Internamente subsistem algumas liberdades e direitos, mas a politica externa é a de um estado terrorista.
A engrenagem imperial está em movimento. Primeiro foi o Iraque, depois o Afeganistão, depois a Líbia. Agora o alvo é a Síria.
A máquina mediática trituradora das consciências repete o método utilizado na campanha que precedeu o ataque armado à Líbia. A CIA e o Pentágono prepararam e financiaram grupos de mercenários que instalaram o caos nas grandes cidades sírias. O presidente Bachar al Asad foi demonizado e, inventada uma realidade virtual uma Síria imaginária uma campanha massacrante tenta persuadir centenas de milhões de pessoas de que intervir militarmente naquele pais seria "uma intervenção humanitária" exigida por aquilo a que chamam "a comunidade internacional". Mas o projecto de repetir a tragédia líbia está a esbarrar com a oposição, até hoje inultrapassável, da Rússia.
Insisto: compreender o funcionamento da monstruosa engrenagem montada pelo imperialismo para anestesiar a consciência social e criar um tipo de homem robotizado é uma exigência no combate dos povos em defesa da liberdade, da própria continuidade da vida.
Não exagero ao definir como tarefa revolucionária essa luta.
Vila Nova de Gaia, 13/Junho/2012