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Primeira Edição: Informe Político da Comissão Executiva ao Pleno do Comitê Nacional do PCB em 8 de Dezembro de 1946.
Fonte: Problemas Atuais da Democracia, Editorial Vitória, 1947, pág: 475-515.
Transcrição e HTML: Fernando A. S. Araújo
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Camaradas!
São passados mais de quatro meses daquele grande acontecimento político que foi a III Conferência Nacional de nosso Partido. Hoje, nesta reunião plenária do Comitê Nacional, devemos estudar a situação em que nos encontramos, fazer o balanço crítico de nossa atividade nos meses decorridos, para, ajustada nossa linha política à realidade em que vivemos, assegurarmos novas perspectivas para nosso trabalho e traçarmos as tarefas dos próximos meses.
Camaradas!
Em vez da ilegalidade, da derrota, tão desejada pelos nossos inimigos e tão temida pelos vacilantes e covardes, faltos de perspectiva política, chegamos a esta reunião mais uma vez vitoriosos, dispostos a comemorar os grandes e novos êxitos de nosso grande e glorioso Partido. Esses quatro meses que nos separam da III Conferência Nacional assinalam, sem dúvida, grandes vitórias — vitórias de nosso Partido, vitórias do proletariado e do povo na luta pela democracia, o progresso e a independência da Pátria.
Podemos afirmar com satisfação e orgulho que conseguimos levar a bom termo as principais tarefas traçadas pela III Conferência Nacional. Ao inimigo ainda não foi possível desta vez barrar o processo democrático em nossa Pátria. Foi promulgada a nova Carta Constitucional e é sob sua proteção que hoje aqui nos reunimos apesar do desespero de nossos inimigos, da raiva fascista ainda há poucos dias tão claramente manifestada. Já estamos livres do arbítrio dos decretos-leis, do mostrengo de 10 de Novembro. Não alcançamos ainda a Constituição democrática e progressista que reclamam os superiores interesses de nosso povo, mas com a Carta de 18 de Setembro demos, sem dúvida, mais um grande passo para a frente, no caminho da democracia, de sua consolidação, batemos mais uma vez ao fascismo que foi compelido a recuar obrigado como está à vida ilegal dentro dos termos da Constituição que, se não assegura o progresso, na medida em que o desejávamos, garante ao menos a liberdade, em termos de tal maneira inequívocos, que nem os Lira, nem os Costa Neto conseguirão sem escândalo negá-los ou mesmo deturpá-los a serviço do fascismo ou do capital estrangeiro reacionário e colonizador.
Uma Carta Constitucional democrática no menor prazo possível — tarefa assinalada com destaque pela III Conferência Nacional — foi alcançada e, isto, sem dúvida alguma, graças antes e acima de tudo à atividade de nosso Partido e à justeza de sua linha política, graças à energia, à coragem e à audácia com que à frente do proletariado e do povo soubemos lutar consequentemente, desfazendo as manobras e as provocações fascistas, desmascarando os traidores e os capitulacionistas, defendendo a ordem, mas protestando sempre contra as arbitrariedades do poder e os arreganhos desesperados do fascismo.
A realização do Congresso sindical foi a segunda grande vitória nesses meses que nos separam da III Conferência Nacional. Sua realização foi um êxito na luta ingente pela unidade da classe operária em nossa terra. Assinalada com vigor sua urgente necessidade pela III Conferência Nacional, foi sem dúvida, graças aos esforços de nosso Partido, à flexibilidade tática, à habilidade com que soube desmascarar as manobras divisionistas dos inimigos do proletariado, à persistência e à energia com que soubemos orientar os trabalhadores no caminho da unidade, foi devido a nós, comunistas, enfim, que Negrão de Lima e seus policiais ministerialistas tiveram que ceder e convocar o Congresso, e permitir a livre discussão em seu seio para acabar arrancando a máscara quando viram não ser mais possível impor aos trabalhadores brasileiros as normas fascistas do Estado Novo. Vitória das maiores, do proletariado brasileiro nos últimos tempos, vitória na luta pela liberdade sindical, pelos interesses mais imediatos dos trabalhadores, vitória da unidade da classe operária, foi a realização do Congresso Sindical — tarefa também assinalada com destaque pela III Conferência Nacional — mas uma grande vitória de nosso Partido, da justeza com que foi aplicada sua linha política, e da persistência com que lutamos pela organização e unidade do proletariado em nossa terra. E o que é ainda de assinalar — com essa vitória levou o MUT a bom termo sua histórica e gloriosa missão: está afinal fundada a grande Confederação dos Trabalhadores do Brasil que há de ser o esteio máximo da democracia em nossa terra.
Nessa enumeração das tarefas fundamentais determinadas pela III Conferência Nacional de nosso Partido e vitoriosamente levadas à prática nos últimos meses, chegamos à grande e impressionante realização que foi a campanha pela imprensa popular. Do sucesso da campanha e da experiência prática notável que nos trouxe deveremos ainda tratar neste informe.
Algo mais, no entanto, devemos assinalar ao apreciar a atividade de nosso Partido nos meses decorridos desde a III Conferência Nacional. Queremos nos referir à melhor compreensão de nossa linha política. Todo o Partido vai mostrando na prática da própria vida que já a conhece e faz esforços por aplicá-la com justeza em quaisquer circunstâncias. A União Nacional começa a ser realizada não só através do esforço unitário pela base como também por parte de diversos organismos dirigentes, mau grado a complexidade do problema político brasileiro e dos obstáculos mil que ainda dificultam e embaraçam o esforço unitário dos comunistas.
As tentativas desesperadas da reação ajudaram, por outro lado, a popularizar o verdadeiro sentido de nossa luta por ordem e tranqüilidade. Hoje, já não são os comunistas somente, é o povo no que tem de mais humilde, sincero e honesto, que vai aprendendo a defender-se das provocações policiais e fascistas. As tentativas reacionárias contra a «Tribuna Popular», o «quebra-quebra» de Agosto e, ainda agora, as provocações em torno do 27 da Novembro, ensinam na prática, graças à atividade esclarecedora do Partido Comunista, qual a tática a usar contra os provocadores. De todas essas tentativas da reação, o Partido saiu mais forte e o povo politicamente mais esclarecido e disciplinado em torno da linha política do seu Partido de vanguarda. Mas isto devido fundamentalmente à justeza de nossa linha política.
Já podemos hoje afirmar, que a tendência ao desvio de esquerda, as tentativas golpistas e aventureiras, criticadas na III Conferência, foram superadas nas fileiras do Partido. Nossos militantes defendem-se com prudência e sangue frio das provocações e já vão aprendendo a evitar aquele velho erro dos que pensam mover-se para a esquerda e, caindo nas provocações do inimigo, na verdade andam para a direita e dão a vitória à reação.
Vencida a tendência de esquerda, pelo menos no que tinha de mais perigoso para o Partido, resta ainda a passividade, o pouco vigor no protesto legal contra as arbitrariedades da reação e dos restos do fascismo. Esse desvio de direita é ainda visível e perigoso em nossas fileiras, conseqüência que é em boa parte da falta de capacidade de mobilizar grandes massas, da falta de melhor ligação com as massas, da incapacidade na escolha de formas legais de luta cada vez mais altas e vigorosas para protestar, como é necessário, contra a reação. Na verdade, sem ligação com as massas, sem conseguir mobilizar grandes massas impossível será, dentro da ordem e da lei, qualquer protesto formal e vigoroso capaz de barrar a reação e de fazer bater em retirada os restos ainda atrevidos e audaciosos do fascismo. Esse o grande problema que deve agora chamar a nossa atenção e na solução do qual devemos utilizar toda a experiência adquirida particularmente nessa memorável campanha pelos dez milhões para a imprensa popular.
Anotemos, antes de mais nada, o que na verdade revelou o sucesso dessa campanha — quanto cresce, e com que rapidez, o nível político das grandes massas que se mostraram capazes de compreender a importância da imprensa para o povo; revelou ainda até onde pode ir o espírito de sacrifício das massas, sua confiança em nosso Partido, no Partido Comunista e particularmente em seus dirigentes, em cujas mãos não receou depositar suas últimas e escassas economias e, muitas vezes, os magros recursos com que mal pode matar a própria fome.
A vitória de nosso Partido nessa campanha dos dez milhões alcançados e sobrepassados diz bem alto do quanto estão errados os que não confiam no povo. Diz ainda, e de forma gritante, que se não somos mais fortes, mais poderosos, é simplesmente porque não sabemos ir ao povo, para esclarecê-lo, orientá-lo, para solicitar seu apoio e a flama de seu entusiasmo. A campanha em prol da imprensa popular provou, de maneira categórica e definitiva, que o povo sempre corresponde aos que a ele se dirigem com confiança e honestidade de propósitos, que o povo sabe então dar tudo quanto possui e ajudar com todo o vigor aqueles que sinceramente lutam pela liberdade e pelo progresso.
Não é possível, no entanto, que fiquemos nessa simples constatação das grandes qualidades de nosso povo. O sucesso na campanha não nos deve também fazer esquecer os erros cometidos, as debilidades manifestas de todo o nosso Partido, de alto a baixo. Que de forma alguma não nos suba o entusiasmo à cabeça, embotando o espírito crítico e impedindo assim que aprendamos na escola de nossos próprios erros. Precisamos aproveitar a grande experiência dessa campanha que foi, sem dúvida, a que melhor até agora revelou o Partido política e organicamente, para estudar profundamente nossas próprias debilidades, nossos erros e grandes falhas.
Como pontos de partida para a discussão que sobre o assunto devemos fazer nesta reunião de nosso C. N. quero assinalar os três seguintes:
1) — A incompreensão da importância política da campanha. Foi esse o erro inicial de nossa própria Comissão Executiva, e até mesmo do C. N. que nas resoluções da III Conferência não soube dar o necessário destaque à grande tarefa prática que constituía sem dúvida o elo fundamental da atividade do Partido no período que se seguiu à realização daquela Conferência. Em conseqüência, não foi capaz a C. E. de planificar com antecedência o empreendimento, nem de transmitir a todo o Partido seu sentido político e a consciência de sua importância. Só depois de algumas semanas veio isso a acontecer e a ser traduzido na atividade prática da C. E., que passou de todo a dirigir e controlar a campanha e a realmente ajudar, na medida de suas possibilidades, aos Comitês Estaduais do Partido. Quanto a estes, em geral, só nas últimas semanas da campanha compreenderam — e não todos — a significação política do empreendimento e conseguiram ainda dirigir com alguma eficiência a fase final e decisiva. Tudo isso serviu para melhor revelar um velho e perigoso defeito no nosso trabalho de direção — a improvisação, a leviandade, a falta de planificação prévia de nossa atividade prática. A superação desse defeito nos levará à vitórias muito maiores do que a da campanha dos 10 milhões.
2) — A incompreensão da importância organizativa da campanha. Aqui devemos dizer que apesar dos esforços da C. E. não foi em geral compreendida a campanha como fator de organização. Muito pouco avançamos nesse terreno, apesar de tudo quanto foi dito em suas numerosas circulares pela Comissão Nacional Pró-Imprensa Popular. Nem ao menos foi regularizada a finança normal do Partido. A campanha revelou enfim, o quanto se subestima ainda em nossas fileiras a necessidade de organização, revelou a pouca importância dada pelos nossos militantes à necessidade imprescindível de fazer do Partido um todo realmente organizado em que cada militante tenha tarefas a realizar, deveres a cumprir, seja de fato um ativista e não um mero simpatizante. Precisamos, no entanto, passar rapidamente desse Partido amorfo, em que, para uns poucos que efetivamente trabalham, corresponde um número muito maior de militantes não ativistas, para o Partido realmente estruturado em que todos sejam ativistas, paguem normalmente suas contribuições e estejam eficientemente ligados de alto a baixo e vice-versa, porque só assim, à palavra de ordem da direção, poderá corresponder com rapidez necessária a ação eficiente de todo o organismo.
3) — A incompreensão no que toca à consolidação das ligações com as massas. Era evidente que os dez milhões de cruzeiros não poderiam ser obtidos dentro das fileiras do Partido, que só seriam alcançados se fossem solicitados às grandes massas com as quais através da campanha deveríamos estreitar nossas relações, como realmente aconteceu. É de assinalar, no entanto, que essas relações não foram consolidadas e que através da campanha pouco avançamos no terreno da organização popular. Esta a nossa terceira grande debilidade, que graças à campanha aí está revelada diante de todo o Partido e que precisa ser superada através da mais ampla discussão e profunda autocrítica, de maneira a encontrarmos suas causas verdadeiras.
Resumindo, devemos reconhecer que a campanha dos dez milhões não foi vitoriosa em conseqüência propriamente da força orgânica do Partido nem, muito menos, das qualidades de comando de seus organismos dirigentes. Vencemos graças ao esforço, à dedicação, à capacidade de sacrifício da parcela realmente ativista em nossas fileiras, vencemos graças à enorme influência do nosso Partido, cada vez mais querido das massas, graças ao prestígio crescente de nossos principais dirigentes. Foi, sem dúvida, uma grande vitória, importante não só pelo seu resultado prático e pelo que prestigiou o Partido, como também pelo que nos revelou a respeito de nossas grandes falhas e terríveis debilidades.
A campanha dos dez milhões veio nos sacudir e gritar aos nossos ouvidos que o nosso Partido poderia ser grande e é pequeno; que o nosso Partido que precisa de uma direção eficiente, capaz de comandar, de dirigir operativamente, tem direções ainda ineficientes, em grande parte burocráticas e politicamente débeis; que o nosso Partido que arrasta tão grandes massas não foi, no entanto, até agora, capaz de organizar essas massas e de realmente dirigi-las. Estas, entre outras, nossas falhas e debilidades principais.
É certo que tudo isso tem sua razão de ser na própria estrutura social de nosso povo, no caráter semifeudal e semi-colonial de nossa economia, no atraso e primitivismo de nossa indústria, na origem camponesa ainda tão próxima de nosso proletariado e na influência ideológica da pequena burguesia em suas fileiras. Além disso são ainda sensíveis os efeitos maléficos da ditadura no baixo nível político do povo, desde as grandes massas camponesas, privadas de qualquer forma de organização nos latifúndios em que são exploradas, até o proletariado sistematicamente ludibriado durante anos pela demagogia trabalhista e pretensamente salvadora do Estado Novo. Tem explicação ainda na situação em que se encontram as mulheres, duplamente escravas e oprimidas em nossa sociedade, e na maneira sistemática com que durante anos foi a nossa juventude afastada de qualquer cogitação política.
Sem dúvida, o nosso Partido cresce, faz campanhas memoráveis como essa dos dez milhões, tem capacidade para descobrir tarefas, formulá-las e executá-las com sucesso. É o maior Partido Comunista do Continente. Mas isto só acresce nossas responsabilidades, porque tem como conseqüência necessária, o reforçamento da agressividade da reação, a preocupação do imperialismo que trata de concentrar seu fogo contra o nosso Partido, em que vê com razão seu maior e mais eficiente inimigo no Continente. De outro lado, é claro que as condições objetivas, a miséria das massas, as contradições imperialistas, as contradições de classe no país — são cada vez mais graves e podem levar a choques que só serão favoráveis à democracia e ao progresso se o movimento de massas estiver, política e organicamente, à altura dos acontecimentos. Na verdade, o movimento de massas não tem ainda a envergadura necessária, é em grande parte espontâneo e amorfo, não está nem mesmo na altura das grandes conquistas democráticas de 1945.
Este o grande perigo da hora que atravessamos e que precisa ser o quanto antes superado. É indispensável buscar com urgência a forma melhor e mais eficiente de organizar as grandes massas e particularmente de educá-las politicamente. Esta, sem dúvida, a grande tarefa de nosso Partido para os próximos meses, como veremos através da análise, tão rápida quanto possível, que passaremos a fazer, da situação econômica e política em que nos encontramos.
Sobre a situação econômica do país podemos ainda hoje repetir o que já foi dito quatro meses atrás, no Informe Político à III Conferência Nacional, pois a situação continua a mesma, sem que concorressem em nada para melhorá-la até agora — muito ao contrário! — os programas e as medidas aventadas pelos dois banqueiros — um dos quais foi e o outro ainda é — Ministro da Fazenda do atual Governo. Dizíamos naquela data:
«Agrava-se efetivamente a situação das grandes massas trabalhadoras cujos salários perdem, com rapidez cada vez maior, o poder de compra capaz de assegurar o baixo nível de vida habitual. Além da carestia, dos preços cada vez mais altos para todos os artigos de consumo popular, sofrem hoje as camadas mais pobres das populações urbanas novas e surpreendentes restrições com a falta ou escassez dos artigos mais comuns e indispensáveis à sua já mísera alimentação. Do outro lado, no interior do país, as grandes massas camponesas sofrem com a diferença cada dia maior entre os preços de venda dos produtos agrícolas, em geral tabelados, sujeitos a mil restrições, a impostos escorchantes, ao açambarcamento inevitável, às dificuldades cada vez maiores no sistema de transportes, a diferença entre estes e os preços pelos quais conseguem adquirir os artigos industriais indispensáveis e até mesmo os produtos agrícolas especializados e protegidos, como o açúcar, e os derivados da indústria pastoril, como o charque. Essa contradição é principalmente sensível no interior de São Paulo, onde maior já é a penetração capitalista na agricultura e mais generalizadas as trocas monetárias e o contato do camponês com o mercado». (Do Informe Político à III Conferência Nacional).
Faltam-nos dados seguros que nos permitam acompanhar o ritmo de crescimento dos preços e qual a evolução dos salários que se distanciam cada vez mais do custo da vida, agravando sem cessar a situação de miséria e de sofrimento das grandes massas trabalhadoras, assim como de todos os que vivem de rendas fixas, particularmente as viúvas, órfãos e as diversas categorias de aposentados. É fácil compreender o que seja a situação desesperada do proletariado, quando sabemos que um capitão do Exército com vencimentos de 4 mil cruzeiros já não pode manter o nível de vida de um ou dos anos atrás.
Um dos jornais do Sr. Chateaubriand — insuspeito portanto — dizia há dias sobre o que se passa no Rio de Janeiro que
«é uma grande área de fome no país». E agregava: – «Não temos, nesse particular, paralelo senão nas trágicas regiões chinesas e indianas, nas quais a fome e a doença acabaram fazendo parte da própria vida... Estamos, praticamente, num regime de fome, com incalculáveis consequências, sobretudo para a saúde da população infantil. Segundo depoimento de especialistas e médicos dos serviços públicos, a criança pobre do Rio está deperecendo por insuficiência nutrição. As doenças de carência alimentar abrem perspectivas dolorosas aos olhos dos especialistas num quadro sombras confrangedoras. Não há frutas, não há carne, não há verduras e legumes, não há leite, o queijo transformou-se numa comida para potentados financeiros...»
E uma das conseqüências disso é o avanço da tuberculose que alcança no Brasil índices cada vez mais elevados e verdadeiramente alarmantes. Dizem as mais modernas estatística que por cem mil habitantes no Canadá há 52 tuberculosos nos Estados Unidos 57, na Grã-Bretanha 62, no Brasil cerca de 2.000...
Mas, se a produção de víveres não aumenta, em compensação cresce em ritmo cada vez maior o papel-moeda e circulação, como se poderá apreciar pelo quadro abaixo:
Ano |
Milhões de Cruzeiros |
1940 | 5.173 |
1941 | 6.637 |
1942 | 8.230 |
1943 | 10.975 |
1944 | 14.457 |
1945 | 17.531 |
1946 - Janeiro | 17.696 |
1946 - Fevereiro | 17.839 |
1946 - Março | 17.832 |
1946 - Abril | 17.807 |
1946 - Maio | 17.952 |
1946 - Junho | 18.547 |
1946 - Julho | 18.883 |
1946 - Agosto | 19.319 |
1946 - Setembro | 19.742 |
Verifica-se, pois, que durante o período de 1.º de Janeiro a 30 de Setembro do corrente ano, a circulação do papel-moeda aumentou em Cr$ 2.211 milhões, o que representa uma média mensal quase idêntica à do ano anterior. Continua, pois, o processo de inflação apesar das medidas pretensamente deflacionárias postas em prática pelo Sr. Gastão Vidigal, quando na pasta da Fazenda. A inflação continua, porque, se está nela a causa mais imediata da situação de miséria crescente para o nosso povo, é indispensável também compreender que a origem da inflação está no próprio atraso de nossa economia semifeudal e semicolonial. O Brasil foi, na América Latina, um dos países que mais sofreram em conseqüência da crise geral de 1929, ponto de partida de toda uma política reacionária através da qual vem conseguindo a classe dominante dos grandes proprietários latifundiários descarregar sobre as grandes massas trabalhadoras das cidades e do campo todo o peso da crise,
«enganar a nação com paliativos e planos, fazer propaganda de uma prosperidade fictícia que só beneficiava a uma minoria de argentários nacionais e estrangeiros, tudo com a preocupação máxima de impedir o verdadeiro progresso nacional, mesmo à custa das mais duras e impiedosas medidas de repressão policial quando assim se tornava indispensável para abater os incréus da propaganda oficial e os «rebeldes» que insistiam em lutar contra o atraso do país e o próprio aniquilamento físico, cada vez mais evidente, no nosso povo». («Os Comunistas Na Luta Pela Democracia» — Pag. 31).
Estamos frente aos problemas mais elementares da revolução democrático-burguesa, agrária e antiimperialista. É claro que a estrutura econômica do país está a reclamar modificações radicais, sem as quais será não só impossível melhorar a situação das grandes massas, como também assegurar a base econômica da democracia. A liquidação das formas semi-feudais de propriedade e de exploração no campo é indispensável para de fato acabar com a base econômica da reação e do fascismo e assegurar o desenvolvimento e a consolidação da democracia. Além disto, a economia nacional, a industrialização do país, estão na dependência do aumento considerável do mercado interno, o que quer dizer, da elevação do nível de vida das grandes massas da população que na maior parte camponesa e vegeta, miserável e ignorante nas grandes propriedades latifundiárias. Isto nos leva à reforma agrária, à divisão da terra e sua distribuição e entrega às grandes massas camponesas sem terra. Problema urgente cuja solução se vê agora dificultada com os dispositivos reacionários da nova Carta Constitucional, que em seu Artigo 147 e parágrafo 16 do Artigo 141 reforça o velho conceito de propriedade, só admitindo «desapropriação por necessidade ou utilização pública, ou por interesse social, mediante prévia e justa indenização em dinheiro» (parágrafo 16 do Art. 141 da Constituição). Mas, mesmo nesses termos e, portanto, dentro da Constituição, é ainda possível realizar a Reforma Agrária que deve ser cuidadosamente estudada de acordo com as condições particulares de cada região do país. Na próxima sessão legislativa, desde seu início, devemos estar preparados para apresentar os projetos de lei de reforma agrária em que se faça clara e precisa definição de seus fins, em que se diga o que desapropriar e como fazê-lo, em que se estabeleçam bases seguras para o cálculo da «justa indenização, em que se disponha sobre os métodos de colonização», em que se disponha administração democrática das colônias, estímulo ao cooperativismo, etc.
Na reforma agrária está, sem dúvida, a base do desenvolvimento da economia nacional, do crescimento harmônico da agricultura e da indústria no país. É claro, no entanto, que as massas não podem esperar e que medidas práticas urgentes tornam-se necessárias contra a inflação e a carestia da vida. Cada dia que passa é mais séria e difícil a situação das grandes massas populares com o progredir da inflação. Só aos ricos, aos senhores de grandes bens, pode interessar a continuação desse processo; somente aos reacionários e fascistas interessa que se continue avançando para a catástrofe financeira. Insistimos por isso na necessidade de medidas práticas e urgentes e reiteramos agora os onze pontos de nosso Programa de Agosto de 1945, que no seu conjunto é ainda hoje o único que realmente ataca o problema por todas as suas faces, desde o aumento da produção até o aumento de salários, da redução dos impostos indiretos ao aumento fortemente progressivo dos impostos diretos sobre a renda e o capital. Cabe ainda pensar nas medidas práticas que assegurem a organização da produção e da distribuição, através da organização do crédito e de cooperativas de produção e de consumo. A limitação dos lucros e o próprio imposto crescente sobre a renda exigem ainda medidas práticas para o controle dos lucros, medidas que nos poderão levar a aconselhar até a nacionalização dos Bancos.
Sem pretender insistir por hoje nessa série de medidas práticas sobre as quais já existem referências em documentos diversos da direção de nosso Partido, preferimos, para maior clareza a respeito da posição que assumimos no terreno da política econômico-financeira, resumir nos três itens abaixo os princípios gerais da política que defendemos e por que lutamos e lutaremos no Parlamento e no governo.
São eles os seguintes:
1) Enfrentar os problemas econômicos em toda a sua complexidade com um espírito antes de tudo construtivo e não somente crítico. Somos radicalmente contrários a todas as medidas que levem a uma solução catastrófica para a crise brasileira e consideramos um crime insistir conscientemente na marcha para a catástrofe financeira. Isto é conseqüência de nossa própria orientação política de União Nacional, de colaboração democrática com todos os que queiram o progresso do Brasil, em defesa da paz, da ordem e da tranqüilidade, é conseqüência de nossa própria convicção de que somente à reação e ao fascismo possam interessar a desordem, o caos e a guerra civil em nossa Pátria. Mais do que nunca é falsa e criminosa a política pretensamente esquerdista do «quanto pior melhor». Não desejamos a bancarrota do Estado; estamos realmente dispostos a colaborar com todas as nossas forças no emprego das medidas práticas capazes de aliviar a difícil situação financeira do Estado, do Governo brasileiro. E é por tudo isso que somos contrários a uma política sistemática de inflação, apoiando todas as medidas capazes de sanear a moeda nacional, de assegurar o equilíbrio orçamentário, etc. Para combater eficientemente a inflação é indispensável uma política de solidariedade nacional, de baixo para cima, de sacrifícios tanto quanto possível proporcionalmente distribuídos, cabendo aos mais ricos, especialmente às grandes fortunas concorrer com maiores parcelas para os cofres públicos. Essa orientação nos leva. forçosamente ao imposto fortemente progressivo sobre o capital e os lucros, bem como aos empréstimos forçados como única maneira justa de conseguir, sem novas emissões de papel-moeda, os recursos indispensáveis ao equilíbrio orçamentário.
2 — Compreender que o problema da inflação no Brasil é antes de tudo um problema político e econômico que não poderá ser resolvido com simples medidas burocráticas de caráter financeiro ou bancário. Nem com a estúpida restrição do crédito e as proibições de exportação do Sr. Gastão Vidigal, nem com a proliferação de Bancos da proposta última do Sr. Corrêa e Castro. Precisamos aumentar a produção nacional, facilitar seu transporte, estimular as trocas internas, reduzir ou acabar de vez com o complicado sistema de tributos indiretos que tanto prejudicam a economia nacional. Não insistiremos nas medidas práticas capazes de levar um sério estímulo à produção, desde as facilidades de crédito orientado até à distribuição de terras junto aos grandes centros de consumo e às vias de comunicação, porque a elas já foram feitas referências em documentos de nosso Partido. Cremos, no entanto, que é chegada a hora de fazermos um apelo ao proletariado no sentido de que seja realmente aumentado o rendimento do trabalho. A classe operária precisa compreender a gravidade do momento que atravessamos e que o aumento da produtividade do trabalho é uma das condições para conseguir construir no país um regime realmente democrático. Naturalmente a luta consciente do proletariado pelo aumento da produtividade está ligada à melhoria necessária das condições de trabalho, bem como à conquista de um salário real que assegure um nível de vida digno para a família operária. O certo é que, em benefício da democracia e da solução pacífica de nossos principais problemas, devemos hoje fazer esse esclarecedor e insistente apelo ao proletariado para que aumente a produtividade do trabalho.
Lutar pela maior assiduidade no trabalho, pelo seu rendimento maior, é lutar conscientemente pelo progresso nacional, é lutar por uma saída pacífica para a crise, é provar na tática que ao proletariado não interessa a desordem, é fazer um esforço prático no sentido de maior aproximação com o patrão, em busca da solução pacífica das contradições de classe inevitáveis na sociedade capitalista. É tentar a harmonia entre operário e patrão nas relações capitalistas para melhor lutar contra o atraso, a miséria e a ignorância em que vegeta o nosso povo. É melhor concentrar a luta contra o latifúndio e o imperialismo. Através dessa luta prática pelo rendimento maior do trabalho será mais fácil atrair à União Nacional as camadas mais progressistas da burguesia nacional, e, assim, conseguir o isolamento e o desmascaramento mais rápido dos reacionários, ligados ao latifúndiarismo retrógrado e aos grandes bancos estrangeiros. Essa luta do proletariado pelo aumento da produtividade mostrará na prática a toda a nação de que lado estão os patriotas, os que mais se sacrificam pelo progresso do Brasil e, de outro lado, quais são os traidores, os sabotadores da produção nacional, os que se colocam contra a solução pacífica dos problemas nacionais, os que defendem seus interesses egoístas e imediatistas contra os interesses superiores da Nação.
É claro, de outro lado, que o esforço operário em benefício de todos precisa ser acompanhado pela política governamental de solidariedade nacional através do imposto progressivo sobre os grandes capitalistas e de medidas práticas contra a especulação e a sabotagem.
3) — Como terceiro princípio geral de nossa política contra a inflação devemos insistir na necessidade de conseguir uma melhor e mais justa distribuição da renda nacional através de elevação considerável dos salários e dos vencimentos inferiores ao nível mínimo capaz de assegurar vida digna para o trabalhador e sua família. Como já dizíamos na III Conferência Nacional:
«A luta por melhores salários é, no momento, a forma mais eficiente de que dispõe o proletariado para exigir do governo medidas práticas e imediatas contra a carestia e a inflação. O proletariado não pode morrer de fome, e, na verdade, na medida que lutar com energia por melhores salários, está, de fato, buscando uma saída pacífica para o descontentamento popular e desarmando os reacionários e fascistas que desejam o caos e a guerra civil, na esperança de liquidar o movimento operário, de impedir a consolidação da democracia».
Aos economistas da classe dominante se afigura, por vazes, contraditória essa política de aumento de salários como medida contra a inflação. Convém, no entanto, notar que aumento de salários só acarreta aumento de preço porque os industriais resistem ainda à diminuição dos lucros, à uma melhor e mais equitativa distribuição da renda nacional. Esta, no entanto, uma das maneiras práticas de fazer barrar o processo da inflação, como, um tanto a contragosto, chega a confessar em recente trabalho sobre a inflação o Sr. Mario de Andrade Ramos, ao escrever:
«O Professor de Ciência das Finanças, McCracken, da Universidade de Louisiana, reproduzindo uma série de estudos e um vasto inquérito sobre questões econômicas e financeiras, evidencia a necessidade de estimular as trocas, e isto só se consegue fazendo com que uma parte da renda nacional se canalize dos grupos que percebem altos proventos e lucros em direção aos grupos que percebem pequenos lucros e rendimentos». (Jornal do Comércio, 24-XI-48).
É justamente isto o que precisam compreender todos os patriotas, democratas e progressistas. A inflação é um mal que precisa ser combatido em um sincero e honesto movimento de união, de solidariedade nacional. Para evitar a catástrofe financeira é indispensável aumentar a produção, equilibrar o orçamento público, redistribuir de forma mais justa a renda nacional. Se o proletariado é capaz de compreender a necessidade de aumentar a produtividade e de por isso lutar, devemos também aceitar que os elementos progressistas da classe dominante, os verdadeiros patriotas, compreendam também a necessidade de concorrer com sua colaboração nesse esforço pela União Nacional, apoiando as medidas restritivas dos grandes lucros dentro dos princípios anteriormente expostos.
Dito isto, passemos agora à análise da situação propriamente política que reflete, como não podia deixar de ser, as conseqüências desastrosas da difícil situação econômico-financeira que atravessa o país.
Podemos ainda hoje repetir o que já afirmávamos em Junho último, na III Conferência Nacional:
«A união formal de nosso Partido com os da classe dominante é ainda difícil, dada a composição heterogênea desse últimos e devido às posições decisivas que em geral aind ocupam em seus organismos dirigentes conhecidos reacionários, declaradamente anti-comunistas. É o que explica, aliás a posição suicida de tais partidos, incapazes até agora de qualquer posição firme em defesa da democracia contra os arreganhos policiais e fascistas».
Os restos fascistas procuram impedir a aliança do PCB com as agrupações políticas nacionais. É compreensível. que agora, às vésperas de eleições, já seja maior o número de políticos de todos os partidos capazes de tomar posição contra a reação e o fascismo, dos que protestam contra as arbitrariedades policiais e as mensagens e projetos inconstitucionais do Poder Executivo. Aumenta mesmo, à medida que cresce a força de nosso Partido, o número de homens suficientemente esclarecidos e capazes de compreender a necessidade de uma maior aproximação com o Partido Comunista. O que é certo, no entanto, é que a velha chantagem fascista de ameaça e de intimidação através da manifestação de um ou outro general fascista que pretende falar em nome das forças armadas da Nação, ainda consegue surtir efeitos e impedir a união dos democratas — homens e correntes políticas. É mesmo característico da situação que atravessamos a contradição entre o empenho que manifestam tantos políticos e as correntes que representam sem contar com o apoio de nosso Partido e o receio quase sempre declarado de que esse apoio se possa tornar público. E isto se dá não só devido à pressa dos restos fascistas que ainda ocupam posições importante no aparelho estatal e à influência e aos recursos de que ainda dispõe a parte mais reacionária do clero católico, como também ao papel decisivo que exercem nos grandes partidos da classe dominante seus elementos mais reacionários e retrógrados ligados à grande propriedade latifundiária e aos banqueiros estrangeiros. Ainda há poucos dias éramos procurados por representante autorizado de importante partido de São Paulo que desejava nosso apoio ao candidato «democrata» que pretendia lançar ao governo paulista e, no entanto, passados poucos dias, líamos declarações formais dos principais dirigentes do mesmo partido, contrárias a qualquer aproximação conosco e reeditando, no velho estilo goebeliano, as mais soezes infâmias, mentiras e tolices do conhecido arsenal fascista do anticomunismo. Certamente, não pretendemos ignorar essas vacilações nem deixaremos de utilizá-las a serviço do progresso e da democracia, fazendo concessões aos que de nós se aproximam e redobrando nossa luta contra os que se inclinam para o fascismo e cuja máscara democrática aproveitamos o ensejo para acabar de arrancar.
Mas se a união formal de nosso Partido com outro qualquer que queira defender a democracia não foi ainda possível, é também de assinalar como crescem a divisão e o desentendimento no campo dos Partidos das classes dominantes. É que o aprofundar crescente da crise econômica agrava cada vez mais as tremendas contradições inevitáveis na estrutura semifeudal e semicolonial de nossa sociedade. A luta pelo poder, pelo Tesouro e pelo Banco do Brasil, pelo direito de fazer Interventores estaduais e Prefeitos municipais, torna-se cada dia mais aguda e decisiva. Ter o apoio do governo do centro, gozar de suas graças, é fator indispensável para um mais fácil predomínio no Estado e no Município. Daí as divisões e subdivisões, as lutas que parecem irreconciliáveis num dia e levam ao acordo, à coalizão, ao cambalacho no dia seguinte.
Daí a ridícula dança das letras — UDN, PR, PSD, PTB — que dizem tudo e nada dizem, marcam hoje udenistas que são os melhores pessedistas, ou pessedistas que são trabalhistas e trabalhistas que são pessedistas e republicanos que deixam a UDN pelo PSD e vice-versa. São todas as mesmas agrupações em que há de tudo e que portanto se equivalem e que só se distinguem por estar no poder ou fora dele. Na atualidade brasileira a confusão ainda mais se agrava em conseqüência da atitude do Chefe da Nação que oscila entre interesses contraditórios, sob a pressão dos acontecimentos e o dilema de defender os interesses nacionais ou ceder aos reclamos e às exigências cada dia mais descabidas, atrevidas e audaciosas dos representantes e agentes do capital financeiro, muito especialmente o imperialismo ianque, no que tem de mais reacionário e agressivo.
Está sem dúvida, no fundo de todas as contradições que hoje dividem os partidos da classe dominante em nossa terra, o conflito máximo entre interesses ianques e ingleses, na luta que sustentam pelo predomínio imperialista e hegemônico em nossa Pátria e no Continente. É isto que explica porque a qualquer coalizão no governo há de sempre corresponder outra coalizão dos que querem uma política oposta a serviço de outro imperialismo. Sentimos aqui em nossa terra o quanto ainda resiste Perón apoiado sem dúvida pelo imperialismo inglês, à política do Departamento de Estado norte americano. Para que lado orientará afinal o General Dutra a política de seu governo. Persistirá na tendência pró-Londres, do Sr. João Neves da Fontoura? Cederá às exigências ianques em troca de alguns tanques e canhões com os quais o Departamento de Estado ainda espera nos poder arrastar à desejada guerra contra Perón, isto é, contra os banqueiros ingleses lá do Prata? A viagem do General Obino aos Estados Unidos neste instante nada tem de tranqüilizadora para a Nação, como certamente já compreendeu S. Excia. que vem insistindo em declarações pacifistas e democráticas. Para que precisamos de armas neste instante? Porque pactos de defesa? Defesa contra quem, se o único perigo externo que nos ameaça só pode vir justamente do imperialismo ianque?
De outro lado, não é cedendo a Londres, nem aos agentes do imperialismo inglês em nossa terra que conseguirá o governo resistir à pressão ianque, como já o dissemos em tempo, logo após a visita do Sr. João Neves a Londres, em nota de 3 de Outubro último da Comissão Executiva de nosso Partido.
As forças da classe dominante dividem-se assim em dois bandos principais, quaisquer que sejam os partidos a que pertençam, partidos que, na verdade, só servem para arrastar por meio de bandeiras e programas mais ou menos demagógicos as massas populares ainda não esclarecidas.
Mas dentro de cada partido, com a agravação da crise aumentam as contradições de classe entre os elementos da pequena burguesia, por exemplo, mais pobres e radicais e os grandes proprietários feudais, grandes comerciantes e industriais ligados aos Banqueiros estrangeiros. Crescem mesmo, e de maneira visível, as contradições entre os elementos progressistas da burguesia nacional e aqueles mais reacionários das classes dominantes que lutam pela conservação do «status-quo» de opressão, de miséria e de ignorância. Particularmente a burguesia industrial que mais prosperou nos últimos anos, burguesia em geral mais avançada, progressista e audaciosa, sente a exploração crescente do capital bancário nacional ou estrangeiro que lhe suga a maior parte de seus lucros e que tenta ainda sufocá-la com a concorrência estrangeira, com a falta de energia elétrica, com a complicação tributária, com transportes precários e caros. Essa contradição é visível em todos os partidos da classe dominante, mas de maneira mais clara no seio do PTB — organização política com que o Sr. Getúlio Vargas pretende defender seu predomínio de classe, isto é, o predomínio dos grandes proprietários latifundiários, através de pequenas concessões à burguesia progressista e o ludibrio do proletariado com a sua legislação trabalhista que fez dos sindicatos instrumentos de opressão e perseguição policial, que proclama o salário mínimo para na verdade legalizar salários de fome, que fala em aposentadorias para na prática reduzir à fome e à morte lenta os inválidos e os operários mais velhos que acreditam nos Institutos e em sua demagogia. Mas, com o avançar da crise, aprofunda-se a contradição entre os industriais e comerciantes progressistas, de um lado, e os grandes proprietários feudais ligados aos grandes banqueiros nacionais e estrangeiros, de outro, e, isto, se traduz na linguagem diferente que falam seus respectivos porta-vozes. Enquanto Vargas ataca a Constituição e a democracia, insistindo no velho chavão fascista da ineficiência do Parlamento e da democracia, o Sr. Hugo Borghi, que representa o outro lado, afirma em Jaboticabal, em recente discurso, justamente o contrário:
«Não é sufocando, pela violência, os anelos do povo, ou aceitando fórmulas antidemocráticas que tendem a ludibriá-lo, evitando-lhe o pronunciamento, que o. governo poderá encontrar apoio na opinião pública».
Isto mostra o quanto é heterogênea a burguesia nacional. É evidente que não pode haver grande entendimento político entre o industrial que entrega 42% de seus lucros anuais aos Bancos e empresas de seguro e os financistas que dirigem estas instituições. Ao proletariado cabe apoiar o lado progressista da burguesia nacional e com ela marchar na luta comum contra o grande senhor latifundiário e seus aliados diretos da finança nacional e estrangeira.
Convém notar ainda que a reação, no que tem de mais conseqüente, já sabe também o quanto são precárias suas organizações políticas e, por isso, não desiste de reagrupar suas forças em partido tipicamente fascista, bando de aventureiros sob a direção ostensiva de conhecidos quinta-colunistas integralistas, agentes confessos do nazismo, como Plínio Salgado e seus asseclas. Essa reorganização do integralismo, sob o nome de PRP, é um insulto à Nação e a todos os que se sacrificaram na luta contra o fascismo. Precisa e deve ser desmascarado como bando que é de provocadores anticomunistas e antidemocráticos, através cujas manifestações o que pretende a reação é fazer demonstrações de força, do prestígio que ainda goza o fascismo junto às autoridades como o Prefeito desta Capital, Sr. Araújo Góis, que tem o cinismo de negar o Teatro Municipal aos ex-combatentes da FEB para cedê-lo aos traidores integralistas. Servem ainda os bandos do PRP para provocar desordens, movimentos populares como os de Florianópolis e Curitiba, determinados pelo ódio antifascista natural, espontâneo e incoercível daqueles que mais de perto conheceram a infâmia integralista, desordens, que, por sua vez, podem sempre ser atribuídas ao Partido Comunista e servir de pretexto para novas medidas contra a democracia. É indispensável por isso alertar as grandes massas contra a provocação integralista, não permitindo também que a luta contra PRP possa nos desviar do combate sistemático e persistem aos restos do fascismo, a conhecidos quinta-colunistas que ocultam noutros partidos ou então ocupam postos importantes no aparelho estatal. Enfim, é já evidente que se reagrupam e se organizam as forças do fascismo em nossa terra. Isto se dá em conseqüência do próprio avanço da democracia da combatividade crescente das grandes massas que se mostram cada dia mais esclarecidas e organizadas, sem que tenhamos até agora conseguido realmente golpear fundo a base econômica da reação, nem deslocar do poder os restos do fascismo e os agentes mais descarados do imperialismo.
Avançamos, sem dúvida, no caminho da democracia, especialmente com a promulgação da Constituição de 18 de Setembro, com suas conseqüências imediatas, qual a libertação dos grevistas processados, a reconquista pelo povo da praça pública, e a convocação das eleições de 19 de Janeiro, cujos prováveis resultados desde já alarmam a reação. Convém notar, no entanto, que esse avanço democrático se vem dando em nossa terra sem que consigamos até agora liquidar a base econômica do fascismo, como são a grande propriedade latifundiária e o predomínio do capital estrangeiro em nossa economia. E isto constitui ameaça constante à democracia, ameaça fascista e imperialista, cujas causas estão além das anteriormente citadas, no crescimento do movimento operário, na organização sindical independente da intervenção do Ministério do Trabalho e que marcha para a unidade e, particularmente, no crescimento do Partido Comunista; na incapacidade da classe dominante, que nada consegue fazer de prático para melhorar a situação econômica das grandes massas; no nível político e orgânico das massas que, se tem progredido, é ainda muito baixo e está aquém das próprias conquistas democráticas dos últimos tempos; na inexistência de uma ampla frente popular e democrática, quer dizer, na divisão e esfacelamento das forças democráticas e, finalmente, no próprio desejo de guerra dos elementos mais reacionários do capital estrangeiro, particularmente o norte-americano. Neste sentido já se fala bem claro na imprensa da classe dominante.
«A verdade é que estamos na fase preliminar da terceira guerra mundial», diz o Sr. J. S. Maciel Filho. «Se a Rússia tem razão ou se essa razão cabe aos Estados Unidos, é um problema muito complexo e que não interessa à nossa posição. Temos compromissos com os Estados Unidos. Esta é a realidade. E toda e qualquer discussão significará a desintegração de nossas energias e o que é mais grave, a guerra civil» (Democracia, 27-XI-46).
E, completando seu raciocínio de fascista e agente do imperialismo, chega o articulista à necessidade de rasgar a Constituição e acabar com o Partido Comunista, como medida necessária para impedir a guerra civil ou mais facilmente arrastar o nosso povo à guerra imperialista.
Este, sem dúvida, o motivo principal do ódio imperialista ao nosso Partido, campeão da paz e da democracia no Continente. Os provocadores de guerra, os agentes do capital financeiro mais reacionário, já compreenderam que a liquidação do nosso Partido é medida prévia sem a qual poderão ser derrotados e desmascarados, como já aconteceu quando do livro Azul e em todas as suas tentativas de guerra ou de exploração e crescente colonização de nosso povo. O embaixador Pawley já o disse há dias, referindo-se ao nosso Partido:
— «Os comunistas parecem estar muito bem organizados no Brasil e desenvolvem enorme trabalho em tentar convencer as massas ignorantes de que os Estados Unidos são imperialistas, frios, inamistosos, incultos e não merecedores de confiança.» (Dos Jornais de 6-XI-46)
— E o New York Herald Tribune já informa que no Departamento de Estado, em Washington, estudam-se planos de grande envergadura para a «luta contra a crescente ameaça do comunismo no hemisfério ocidental». Trata-se, segundo o mesmo jornal, de extirpar o comunismo nos países da América Latina por meio de uma vasta atividade militar, cultural e econômica.
Isto explica suficientemente o zelo «democrático» ou anticomunista de certa imprensa e nos indica a verdadeira origem de certos projetos de lei de segurança e contra os militares. Referindo-se, por exemplo, às próximas eleições e ao provável resultado nesta Capital, chega o Correio da Manhã, em seu zelo imperialista a escrever o seguinte:
«Enquanto as forças conservadoras se diluem e disseminam, contribuindo assim para inutilizar milhares de votos, os comunistas se arregimentam para emprestar aos seus sufrágios a significação do predomínio de um partido. Isso evidentemente terá, em toda parte repercussão comprometedora, porque representando embora um equívoco, pois a Nação é infensa ao comunismo, sendo ainda pequena minoria os partidários do credo vermelho — dá ao mundo a idéia de que somos um povo comunista. Nada mais falso! Mas também nada mais perigoso...» (Em 21-XI-46).
O agente imperialista sente certamente seus negócios ameaçados, e poucos dias depois já reclama do governo, desesperado:
«Não se pode perceber — também até agora de que modo o governo oporá uma barreira à epidemia comunista.» (Correio da Manhã, 30-XI-46).
A reação, os restos do fascismo, os agentes do imperialismo, já não conseguem mais ocultar o desespero que lhes causa o avanço da democracia no país. Muitos daqueles que tanto gritavam em 1945 contra a ditadura, como por exemplo o «venerando» Jornal do Comércio, são já agora os mais descarados inimigos da Constituição e da ordem legal por que diziam lutar. Para esses senhores já é claro que só na violência, no golpe militar, na liquidação da Constituição poderão encontrar os meios de fazer parar o processo democrático, de opor «uma barreira à epidemia comunista.» Mas o mundo se conserva em paz. Aos desejos de guerra da parte mais reacionária do capital financeiro imperialista corresponde a forte vontade de paz de todos os povos. E a democracia avança no mundo, tornando ainda difícil a realização dos planos sinistros dos fabricantes de guerra, dos Churchill, Hoover & Cia... Daí, os recursos para que agora apelam os fascistas — provocações, chantagem, tentativas de toda sorte no sentido de amedrontar as massas, de intimidar as camadas sociais mais vacilantes. Em escala maior ou menor, conforme as circunstâncias, são estes os métodos que vão sendo empregados aqui em nossa terra pelos restos ainda vivos do fascismo. A ele cabe responder com a luta corajosa em defesa da lei e da Constituição, luta rigorosamente legal e ordeira, prudente e orientada no sentido de evitar qualquer provocação.
A democracia avança e o que nos cabe fazer, a todos nós democratas, é defender as posições conquistadas, agir com prudência e sangue frio diante do desespero do inimigo. Para prosseguirmos vitoriosos é necessário, por vezes, saber parar para consolidar as posições alcançadas, porque só assim iremos empurrando pouco a pouco o adversário até a cova em que possa ser definitivamente enterrado.
Nada mais perigoso, nestas condições, do que qualquer erro de esquerda, a precipitação, a tendência golpista ou aventureira. Certamente, não podemos ficar de braços cruzados diante dos atentados fascistas contra a democracia. A luta é indispensável, luta sem tréguas, enérgica e corajosa, mas luta pacífica e rigorosamente dentro da ordem legal estabelecida. Cabe, no entanto, descobrir novas formas de luta cada vez mais altas e vigorosas, desde os simples protestos e manifestações, até o que for possível e conveniente, conforme o nível do movimento de massas a que se houver chegado e à sua força de organização. Mesmo no caso de golpe contra a Constituição ou contra a ordem estabelecida não se deverá sair do quadro rigorosamente legal no protesto vigoroso e decidido. Porque, mesmo em tal caso o essencial é não permitir que a reação se consolide por meio de um banho de sangue. Que o golpe da reação caia no vazio e não consiga derramar uma só gota de sangue operário — essa a maneira mais justa de desmoralizá-lo e de impedir a consolidação da reação. Às ameaças de golpe, às tentativas desesperadas da reação, devemos responder com a luta redobrada pela União Nacional, em defesa da Constituição e da democracia. A maneira por que reagimos quando da suspensão da «Tribuna Popular», nos acontecimentos de 30 e 31 de Agosto e em 27 de Novembro último, são exemplos que precisam ser divulgados e analisados convenientemente.
Mas é claro que essa luta só terá significação se for na verdade, uma luta de massas. Assim também, é evidente que a importância e valor de qualquer gesto ou atitude de protesto está, antes acima de tudo, na dependência da magnitude do movimento de massas.
E aqui chegamos ao ponto fraco de nossa luta pela democracia e pelo progresso. É fraco ainda o movimento popular no País. Grande é a influência de nosso Partido, mas débil a organização das massas que o ouvem e o seguem.
Podemos dizer que nem o proletariado se acha suficientemente organizado. É assustadora a debilidade do movimento sindical.
«Se não avançarmos rapidamente na organização sindical do proletariado, precária será a União Nacional e praticamente impossível a consolidação da democracia», dizíamos já na III Conferência Nacional.
Mas deveremos reconhecer que de lá para cá pouco progredimos. Cabe examinar com cuidado as causas desse atraso, que são muitas e variadas. Enquanto, por exemplo, o sindicato for simples instrumento de luta por melhor salário, difícil será dar-lhe vida permanente, por ele interessar os trabalhadores. Para que o sindicato tenha vida e possa realmente servir de organizador do proletariado, é indispensável que esteja bem ligado à atividade da fábrica, no local de trabalho, através de organismos como comitês, comissões sindicais ou de fábricas, dedicadas particularmente ao conhecimento e estudo de todos os problemas relativos à atividade na fábrica, desde as condições de trabalho até a freqüência e a produtividade do braço operário. São tais organismos os mais capazes de examinar com sinceridade o problema da produção e da organização do trabalho e das possibilidades e melhorá-las. Como diz com razão Togliatti,
«não conseguireis melhorar a situação dos operários se permaneceis passivos neste terreno».
É claro que os sindicatos só poderão crescer na medida em que se mostrarem capazes de sua missão, de realmente concorrerem para melhorar a situação dos operários na fábrica.
E, se é fraca a organização do proletariado, menor é ainda a organização das massas camponesas e pouco progride a das massas populares urbanas. Queremos que fique simplesmente assinalado o fato, sem pretender por agora voltar ao estudo de suas causas já anteriormente referidas, nem ao que deve ser feito para saná-las. Sobre o assunto já possuímos documentos de nosso Partido que precisam voltar a ser estudados como o Informe da C. E. sobre o trabalho de massas apresentado pelo camarada Pomar à reunião plenária de Janeiro deste ano do C. N.
Cabe-nos somente insistir na necessidade urgente de orientar nossa atividade e esforço no sentido da organização das grandes massas, no sentido da organização sindical, popular e camponesa. Isto, sem nos esquecermos, no entanto, que nas condições brasileiras é em grande parte através do Partido que iremos educando politicamente as massas para levá-las a uma organização realmente eficiente e poderosa. Nosso Partido tem sido grande escola de atividade política — essa, sem dúvida, sua grande missão educadora — que precisa, certamente, ser cada vez mais ampliada de maneira a alcançar, no menor prazo possível, as verdadeiras massas populares disseminadas em nosso vastíssimo território. É certo que ao iniciarmos nossa atividade educativa e organizadora junto à massa no local de trabalho ou no de residência, na aldeia ou no bairro, devemos sempre começar pelo organismo de massas, o comitê de fábrica ou de fazenda, o comitê popular enfim, através do qual há de surgir mais tarde o organismo básico de nosso Partido, — que nascerá assim sob a proteção da própria massa. Sempre que for possível, no entanto, e sem maior perda de tempo, devemos fundar o organismo do Partido — célula ou Comitê Municipal — como núcleo que pode e deve ser de ação política e fator decisivo na organização e educação das grandes massas. Precisamos ir às massas, buscá-las organizada e planificadamente onde estiverem e não ficar à espera de que espontaneamente procurem as fileiras de nosso Partido. Precisamos levar a bandeira do Partido a todos os locais de trabalho e a todos os rincões da Pátria, de maneira a disseminar sua ação e aprofundar suas raízes nas grandes massas de nossa população. Precisamos particularmente trazer, o quanto antes, para a atividade política a população feminina que representa a metade da Nação e a grande parcela juvenil que constitui a maioria da massa trabalhadora mais impiedosamente explorada.
Desnecessário insistir sobre a fraqueza do movimento de massas feminino no país — é fato já muitas vezes por nós constatado e que por motivos vários não mereceu até agora maior atenção de nossa parte. É chegado o momento, no entanto, de agir, de concentrarmos realmente nossos esforços a fim de conseguirmos vencer o atraso em que nesse terreno nos encontramos. Na luta pela consolidação da democracia ainda tão ameaçada em nossa terra está a mulher naturalmente colocada em primeira linha como maior interessada, vítima que é redobrada da reação, do fascismo e da guerra. Em nossa sociedade semifeudal a luta da mulher por sua emancipação é força espontânea das mais poderosas que só precisa ser unificada e dirigida para transformar-se em componente decisiva na luta pela democracia e pelo progresso do Brasil.
Para acelerar a organização de um grande e poderoso movimento feminino de massas cabe ao nosso Partido superar nesse terreno suas debilidades, a começar pela subestimação do trabalho específico entre as mulheres. Precisamos ter em cada organismo do Partido, desde as células até o Secretariado Nacional, encarregados especiais do movimento feminino. Além disso, precisamos procurar as causas verdadeiras da afluência ainda pequena de mulheres às fileiras de nosso Partido a fim de conseguir removê-las definitivamente. É indispensável fazer em cada organismo do Partido acurado estudo das condições em que vive a mulher, dos obstáculos que representam suas pesadíssimas tarefas domésticas à possibilidade de qualquer atividade nas fileiras de nosso Partido, de maneira a reduzir ao mínimo possível as exigências estatutárias para que a mulher possa ser militante comunista, possa progredir politicamente como ativista de nosso Partido sem prejudicar suas tarefas domésticas. Outro assunto a estudar é o da vantagem ou não, da necessidade ou não, de permitir em nosso Partido a existência de células femininas, quer dizer, exclusivamente de mulheres. Essas células tanto poderão surgir através dos organismos de massa femininos como servir de ponto de partida, força motriz inicial para a organização feminina de massas.
Quanto ao trabalho de massas entre a juventude, tão precário ainda, é chegado o momento de agirmos com maior decisão e energia, de tomarmos medidas práticas a fim de conseguimos realmente mobilizar a grande maioria jovem da Nação para a luta que tanto lhe interessa, contra a guerra e o fascismo. Parece haver chegado o momento de organizarmos a Juventude Comunista, como amplo organismo de massas que através de seus clubes e associações seja realmente capaz de chegar até onde se encontra de fato a maioria de nossa juventude, de maneira a unificá-la e orientá-la na luta contra a miséria em que se encontra, por uma vida digna, por instrução e saúde, por cultura e diversão, por afastá-la da prostituição e das doenças venéreas, por um futuro enfim menos triste e doloroso, que não seja nem de guerra nem de opressão. Mas que a Juventude Comunista seja de fato um amplo movimento de massas juvenis, ligado ao Partido, sim, mas independente e capaz de unir os jovens de todas as categorias sociais, acima de crenças e ideologias políticas, de todos os que não queiram ser sacrificados em guerras imperialistas e almejam um futuro diferente da realidade atual de miséria, atraso e ignorância, uma Pátria livre, democrática e progressista.
Enfim, para que na verdade possamos defender com o povo, pacífica e legalmente, as conquistas democráticas ainda tão seriamente ameaçadas, precisamos ainda que o nosso próprio Partido chegue a ser de fato o grande Partido de massas, Partido novo tipo, já considerado necessário pelo nosso Comitê Nacional desde sua reunião de Agosto do ano passado.
Nosso Partido tem crescido e vai pouco a pouco superando o sectarismo que tanto tem dificultado sua atividade junto às massas e o seu próprio desenvolvimento no ritmo que seria de esperar e desejar. A campanha pela imprensa popular analisada no inicio deste informe, serviu para nos revelar o tesouro de energia, de patriotismo e de combatividade que continua abandonado no seio das grandes massas populares. Falta-nos ir às massas, nelas confiar, mostrar-lhes o que é o nosso Partido, sempre pronto a receber em suas fileiras os filhos do povo, para com ele prosseguir na luta pela emancipação do próprio povo. Mas é necessário compreender que as massas só virão para nossas fileiras na medida em que soubermos passar de uma propaganda geral e vaga para a verdadeira e eficiente ação política. Do velho Partido de agitadores e propagandistas das idéias gerais do marxismo precisamos passar ao Partido de novo tipo, capaz de ação política, de concorrer com a sua atividade prática para a solução dos graves problemas que atormentam a vida das grandes massas. Ao invés da propaganda, da repetição enfadonha de coisas gerais, numa linguagem em geral inaccessível ou incompreensível para o povo, cabe procurar saber quais são as necessidades do povo e fazer esforços através da ação diária organizada para satisfazê-las. Não poderemos ganhar as grandes massas enquanto elas não nos virem como os principais lutadores por suas reivindicações imediatas. É indispensável acabar com aquela opinião ainda tão generalizada no seio das massas de que lutamos nós, os comunistas, por utopias, por ideais sem dúvida generosos, mas inaccessíveis ou, pelo menos distantes. Ainda há poucos dias afirmava o sr. Hugo Borghi, referindo-se ao nosso Partido:
«Fora ademais inútil dizer-se a um homem que está morrendo de fome que daqui a 50 anos terá alimentação abundante. Mais vale dar-lhe meios de conseguir subsistir do que propor-lhe que sucumba de inanição.»
Estas palavras visam certamente afastar de nossa influência as massas politicamente menos desenvolvidas, pretendem contrapor à educação política das massas, em que tanto insistimos, a demagogia barata da caridade burguesa com a distribuição de macarrão ou outros artigos por preços menos escorchantes. Mas para as massas a que se dirige, aquela linguagem do Sr. Borghi é compreensível porque simplesmente repete o que as camadas menos esclarecidas do proletariado e do povo ainda pensam de nós, em conseqüência do caráter geral pouco prático e realista de nossa propaganda, além do sectarismo de nossos companheiros que vivem a repetir os termos de documentos gerais e a falar de política mundial, m nunca dos problemas práticos e imediatos da fábrica, da cidade ou do bairro. Borghi, no entanto, precisa ser desmentido na prática pela atuação concreta e realista dos comunistas junto às massas. Esta será ainda a maneira mais prática de educar politicamente as massas, dando-lhes a consciência de sua própria força, a fim de que lutem por seus interesses e reivindicações mais sentidas, em vez de ficar à espera do governo ou do Parlamento.
É evidente, portanto, que todos os nossos organismos de base — células, comitês distritais e municipais, devem interessar-se ativamente pelos problemas locais, da fábrica, da municipalidade, da cidade ou aldeia, do bairro. Esses organismos devem e precisam constituir força política prática a serviço do povo, ter a iniciativa na organização de cooperativas, na construção de casas e barracões, de tudo enfim que interessar ao povo, desde postos médicos e hospitais até escolas, bibliotecas e diversões. Quer dizer que muitas das iniciativas até hoje por nós deixadas para os Comitês Populares, podem e devem ser tomadas, sem receio, pelos organismos de base do Partido, que conseguirá assim um grau muito maior de ligação com as massas além de aumentar e ampliar a influência do Partido e de seus dirigentes.
Mas para tanto precisamos começar por modificar nossos velhos e arcaicos métodos de direção.
Nossos organismos precisam de maior autonomia e, portanto, de possuir à sua frente homens responsáveis e capazes que possam na verdade inspirar confiança às massas. Precisamos começar mesmo por colocar à frente de certos Comitês Estaduais ainda politicamente fracos mas responsáveis por um trabalho de direção que se torna importantíssimo para o Partido, nossos melhores dirigentes. Em São Paulo, Distrito Federal, Estado do Rio, Rio Grande do Sul, Pernambuco e Minas Gerais se queremos ter, como é possível, grandes partidos políticos de massa, indispensável se torna reforçar suas direções com nossos melhores quadros, inclusive membros da C. E.
A maior parte dos quadros dirigentes deve vir, no entanto, da base do Partido, através da seleção e promoção cada vez mais audaciosas daqueles que se revelarem na própria atividade diária nos organismos a que pertençam. Existem sem dúvida em nossas fileiras os quadros novos de que tanto necessitamos e devemos estar certos de que é simplesmente subjetiva a dificuldade com que lutamos ainda para encontrá-los. É comum ainda entre nós a tolice de querer descobrir desde o início homens e mulheres perfeitos que ao serem promovidos aos postos de direção já tenham revelado possuir todas ou quase todas as qualidades que o posto exige. Os dirigentes não podem, no entanto, se esquecer que se fizeram dirigentes na prática da própria direção, que é assumindo responsabilidade que os novos quadros mostrarão se estão ou não à altura do posto a que foram promovidos. Cabe-nos ter coragem e audácia, confiança na massa e nas forças do próprio Partido, porque só assim conseguiremos formar um grande número de dirigentes entregando-lhes postos responsáveis, em que mostrem na prática, através da própria luta, as qualidades que possuem e se estão ou não à altura de aprender e progredir. Nesse terreno não terão nenhum resultado exames abstratos ou investigações pessoais conduzidos com critério velho e falso, além de ser em geral subjetivo.
Além disto, na promoção de quadros não devemos esquecer as características novas de nosso Partido que exige à sua frente homens com qualidades, diferentes daquelas anteriormente necessárias, no tempo da vida clandestina e ilegal, ao tempo do pequeno Partido de agitação e propaganda das idéias gerais do marxismo. Cremos, enfim, que podemos resumir nas seguintes as qualidades agora exigíveis na seleção de quadros de direção em nossas fileiras:
Mas o grande Partido de massas exige ainda a imediata melhoria de nosso trabalho de direção, de maneira a conseguir a necessária eficiência de um comando operativo capaz de rápido e melhor controle. Convém notar ainda quão pouco progredimos na organização das secretarias do C. N. e no seu necessário entrosamento, especialmente com a Secretaria de Organização, o que tem sem dúvida dificultado, e muito, todo o nosso trabalho de direção. Outra debilidade das mais sérias que precisa ser o quanto antes sanada está na inexistência prática de uma seção de quadros junto à C. E. que se sente assim cega e incapaz de levar a efeito as grandes e enormes tarefas que pesam sobre os ombros de um número pequeno de companheiros, sempre os mesmos, porque não sabemos onde se encontram os que são capazes de substituí-los ou ajudá-los.
Quanto à nossa imprensa é justo reconhecer que vem melhorando politicamente nos últimos tempos. Cabe-nos agora dedicar maior atenção ao nosso órgão central que precisa de fato refletir a vida do Partido, unificar sua ação e linha política e para tanto, transformá-lo em jornal realmente acessível ao nosso militante de base, capaz de interessá-lo e de se tornar para ele indispensável e querido.
No terreno educativo e da formação de quadros devemos orientar nosso trabalho no sentido de cumprir as tarefas traçadas pela m Conferência Nacional, que ainda não puderam ser realizados, especialmente quanto à organização de cursos de capacitação junto aos CC. EE. Cabe ainda pensar na maneira de formar melhores ativistas e oradores populares.
Camaradas!
Dito isso devemos agora voltar nossa atenção para, a tarefa máxima do Partido no momento que atravessamos, para a grande campanha eleitoral em que já nos achamos empenhados, dispostos como estamos a levar às urnas em 19 de Janeiro próximo, sob nossa bandeira, grandes massas populares — homens e mulheres dispostos a votar nos candidatos registrado sob a legenda de nosso Partido, e, portanto, em defesa da paz e da democracia, pelo progresso do Brasil.
Durante a campanha eleitoral será necessário desmascarar o verdadeiro sentido divisionista, a serviço do fascismo e do imperialismo, do anticomunismo sistemático. Será a oportunidade de mostrar a obra altamente educadora de nosso Partido, seu esforço pela União Nacional, organização do povo, e seu sistemático trabalho de esclarecimento popular contra as provocações e as desordens que só interessam ao fascismo. Será o momento de mostrar a obra patriótica dos comunistas na guerra contra o nazismo, na luta contra o imperialismo, no desmascaramento do Livro Azul, na luta pelas nossas bases militares. Será indispensável popularizar os programas mínimos estaduais, acentuando, para cada setor da população ou camada social, o trecho que mais de perto lhe interessa, ligando os seus termos às reivindicações mais sentidas no local de trabalho, no bairro, na cidade ou aldeia.
Será também a oportunidade de comparar a atuação de nosso Partido com a dos outros: a atividade dos representantes comunistas na Assembléia Constituinte com a daqueles que votaram contra a reforma agrária, contra o voto para os analfabetos, contra as medidas restritivas à exploração de nosso povo pelo capital estrangeiro; de comparar a luta dos representantes comunistas em defesa dos interesses populares na tribuna parlamentar com os conchavos dos politiqueiros na disputa de cargos e posições no governo.
Será esta a melhor oportunidade de nos ligarmos às grandes massas, de junto com elas discutir os seus problemas e orientá-las no sentido de buscar as formas mais acertadas e proveitosas de organização.
Que cada comunista, que cada democrata compreenda a importância do pleito de 19 de Janeiro. Que cada um faça esforços individuais e dentro das organizações a que pertence, no sentido de arrastar milhões de concidadãos às eleições, cidadãos esclarecidos e dispostos a votar nos candidatos registrados pelo Partido Comunista, cidadãos que queiram defender a paz e a democracia, exigir o cumprimento da Constituição e assegurar o progresso e independência da Pátria.
Isto só será possível se soubermos mostrar às massas que está, de fato, no resultado do próximo pleito eleitoral, em grande parte, a possibilidade ou não de uma rápida e justa solução para os graves problemas econômicos da hora que atravessamos. No Plano Nacional de Emulação Eleitoral já foram enviadas a todo o Partido as diretivas práticas a seguir na grande campanha. Cabe-nos ainda falar da tática eleitoral, da atitude a assumir frente aos outros partidos e correntes políticas.
É certo que nossa tática eleitoral está implícita na linha política que praticamos, de União Nacional em defesa da democracia e da Constituição. Fazemos a política de mão estendida e estamos prontos a marchar junto com todos — homens e correntes políticas — que lutem efetivamente contra o fascismo, e isto se define e positiva, nos dias de hoje, pela posição firme e clara assumida em defesa da Constituição, do cumprimento de seus preceitos fundamentais, contra qualquer ato ou gesto inconstitucional. Essa definição se completa ainda pela posição tomada diante do anticomunismo sistemático, pela firmeza em defesa da democracia, da liberdade de pensamento e do respeito à vida e à atividade do Partido Comunista. Não pode ser democrata quem ainda hoje acredita em fantasmas, nem será capaz de defender a Constituição e a democracia quem silencia e se acomoda sem protesto com a atitude reacionária e fascista dos partidos ou correntes políticas a que pertençam.
Nestas condições, e dada a heterogeneidade da composição dos partidos da classe dominante entre nós, não vemos ainda como chegar a uniões formais com organismos políticos em cujas fileiras são mantidos, até mesmo em postos de destaque e direção, conhecidos reacionários e fascistas, anticomunistas raivosos, dispostos sempre a apoiar quaisquer medidas contra a Constituição e a democracia. Poderemos chegar, no entanto, a acordos políticos formais para apoio de uma ou outra candidatura, sempre no entanto, na base de nossa linha política de ordem e tranqüilidade, de apoio aos atos democráticos do governo, contra qualquer política de oposição sistemática, contra qualquer tendência golpista, sempre em defesa da democracia e da Constituição.
Por tudo isso, concorreremos com listas próprias às eleições para às Assembléias estaduais e de vereadores do Distrito Federal. Na eleição para governador de Estado e para as vagas na representação federal nossa posição deve ser antes de tudo unitária e visar levar a tais posições os homens que nos derem maiores garantias democráticas e os representantes de correntes ou partidos políticos que melhor se definam em defesa da Constituição. O essencial é, sem dúvida, tudo fazer para impedir a eleição de conhecidos reacionários e fascistas, o que nos levará talvez a tomar a iniciativa de apresentar também candidatos não-comunistas, nomes populares, naqueles casos em que seja inconveniente ou impossível dar nosso apoio aos outros candidatos apresentados, ou não traga nenhuma vantagem para nosso Partido tomar posição ao lado de uma ou outra corrente política de idêntica composição. Enfim, sempre que não houver perigo da eleição de fascista notório nem vantagem na colaboração com outra corrente política não devemos vacilar em apresentar nossos próprios candidatos, comunistas ou não, e em torno deles tentar a unificação das forças realmente democráticas e progressistas.
A campanha eleitoral servirá assim de meio capaz de nos aproximar das massas, de aumentar o recrutamento de novos membros para o Partido e de consolidar nossa própria organização, além de facilitar a obra difícil de organizar as grandes massas. É através da campanha eleitoral que devemos agora vencer aquelas debilidades anteriormente assinaladas. É através dela que poderemos aumentar nossos esforços para fazer do Partido um grande Partido de massas, verdadeiro Partido de ação política, um Partido de ativistas, em que todos tenham tarefas a cumprir especialmente junto às grandes massas, nas organizações sindicais, camponesas, populares, femininas, ou juvenis, a que devem pertencer. É através da campanha eleitoral que devemos agora fazer novos esforços visando melhorar a direção do Partido, seus métodos de trabalho, suas secretarias que precisam ser realmente organizadas. É através dela, e para que seja realizada com êxito, que teremos a oportunidade de promover com audácia a novos quadros, de aprender a selecioná-los, a instruí-los, a educá-los. Através dela, surgirão novas oportunidades para que possamos fazer dirigentes, oradores e propagandistas. Será também a oportunidade para melhorarmos nossa imprensa e dar maior vida à nossa «A Classe Operária», ligando-a de fato a todo o Partido. Será também o momento de melhorarmos nossos métodos de propaganda de massas, accessível às grandes massas.
E terminada a campanha eleitoral, deveremos prosseguir em nosso trabalho junto às massas e por sua organização. Precisaremos então concentrar esforços no sentido de melhorar nosso trabalho de recrutamento e junto às grandes massas, lançando-nos àquilo que poderá vir a ser forte campanha sindical, pela organização de ligas camponesas e pelo reforçamento rápido do trabalho feminino e juvenil.
Para que o Partido possa vir a ser o grande Partido de massas que se torna cada vez mais necessário, é indispensável fazer revisão de nossos métodos de organização, assim como de nosso programa e estatutos. Não chegaremos também ao grande Partido de massas enquanto não tomarmos medidas práticas e sérias que garantam a democracia interna do Partido, com a rigorosa eleição de todos os seus organismos, de baixo para cima. A direção precisa cada vez mais, para poder dirigir com segurança e vigor, conhecer a opinião de todo o Partido e para tanto exigir que sejam postos em prática métodos de trabalho e formas de vida partidária de tal maneira democráticos que facilitem a todos a livre manifestação de opiniões e de crítica. É indispensável e urgente que todos falem e colaborem na elaboração da linha do Partido. «É nessa escola da livre discussão que surgirão os quadros de que tanto necessitamos», como já dizíamos na reunião plenária de Janeiro deste ano do Comitê Nacional.
Tudo isto nos leva, mais uma vez, a acentuar a necessidade urgente de convocar o IV Congresso do Partido que deve ser o menos formal e burocrático possível. Um Congresso feito com rapidez e que determine a reunião dos legítimos representantes da base do Partido é o que precisamos fazer logo que for possível, sendo de presumir que logo após o pleito de 19 de Janeiro já possamos pensar na data de sua realização.
Camaradas!
Avança a democracia, cresce o nosso Partido. Aproxima-se cada vez mais o fim do fascismo. Um milhão de votos nas próximas eleições, a própria força autocrítica desta reunião, despertam os reacionários, o ódio e o medo de nossos inimigos, o desespero dos fascistas. Os agentes do imperialismo também já sabem que a liquidação de nosso Partido é tarefa indispensável e primeira para que possam realmente prosseguir na exploração crescente de nosso povo. Mais do que nunca precisamos estar atentos, serenos e seguros contra as provocações do inimigo. Mais do que nunca precisamos compreender o verdadeiro sentido de nossa linha política de União Nacional, de prudência e sangue frio, de ordem e paz, de luta corajosa e audaz, dentro da lei, contra as arbitrariedades policiais e em defesa intransigente dos preceitos constitucionais. Nossa situação, nos dias de hoje, tem muito de semelhante com aquela a que se refere Engels no Prefácio de seu livro sobre As guerras camponesas na Alemanha, Prefácio escrito em 1874, quando Bismarck fazia leis contra o socialismo e era sucessivamente batido pelo proletariado alemão:
«Ao estado de sítio do tempo de guerra seguiu-se o processo de alta-traição, lesa-majestade e ofensa aos funcionários do governo, depois as perseguições policiais incessantes do tempo de paz. O «Volkstat» tinha, regra geral, três ou quatro de seus redatores constantemente na prisão; os outros jornais estavam mais ou menos na mesma situação. Todo orador do partido um pouco conhecido tinha de, pelo menos uma vez por ano, comparecer ante os tribunais que, com grande regularidade, o condenavam. Banimentos, confiscos, dissoluções de reuniões caiam como saraiva, mas tudo em vão. Cada militante preso ou expulso era substituído por outro; para cada reunião dissolvida convocavam-se duas ou outras; triunfou-se sobre a arbitrariedade policial por meio da exaustão, pelo sangue frio e pela estrita observância das leis. Todas as perseguições produziram efeito contraproducente, longe de debilitar e liquidar o partido operário, trouxeram-lhe sem cessar novos elementos, novos militantes, o reforçamento da sua organização.
Em sua luta contra as autoridades, tanto quanto contra os burgueses individualmente, os operários se mostraram em toda a parte, intelectual e moralmente, superiores a eles e provaram, notadamente em seus conflitos com os «empregadores», que eram os operários, os homens cultos da época, enquanto que os capitalistas eram os ignorantes. E assim conduziam suas lutas com um bom-humor que prova quanto estavam certos de sua causa e conscientes de sua superioridade. Uma luta assim conduzida sobre terreno historicamente preparado, deve dar grandes resultados. Os sucessos obtidos nas eleições de Janeiro (1871) permanecem únicos no moderno movimento operário até esta data e a estupefação que suscitaram em toda a Europa era perfeitamente justificada», (págs. 18 e 19).
É tão grande a similitude daqueles acontecimentos com o que se passa hoje no Brasil, que nos parecem desnecessárias outras considerações.
É, lutando assim, pacificamente, e pelos meios estritamente legais que poderemos chegar à democracia progressista capaz de assegurar a solução progressiva dos mais sérios problemas de nosso povo. Na Polônia, na Bulgária, na Iugoslávia, prosperam as democracias populares e progressistas que vão, pouco a pouco, liquidando com os trustes e monopólios, nacionalizando os Bancos, as minas e a indústria pesada, eliminando de fato os últimos vestígios do fascismo, com a liquidação de sua base econômica e o castigo aos traidores. «A vantagem dessa democracia popular», diz Dimitrov:
«é que a passagem ao socialismo torna-se possível sem ditadura do proletariado. Cada país passará ao socialismo pelo seu próprio caminho».
E aos que não compreenderam ainda que vivemos em novos dias, em condições históricas completamente diferentes daquelas anteriores à guerra contra o nazismo e que, em nome do marxismo, tomado como dogma morto e frio, protestam contra essa possibilidade de passagem pacífica para o socialismo, respondem os fatos e Thorez, quando mostra a diferença entre os que do marxismo guardam as cinzas, e nós que o alçamos em nossas mãos, e mantemos sempre viva e crepitante, a chama luminosa do verdadeiro marxismo-leninismo-stalinismo.
A verdade é que continua favorável à democracia a correlação de forças sociais no mundo inteiro. A democracia avança como avalanche e não poderá ser assim tão facilmente vencida com a chantagem guerreira da imprensa reacionária ou da diplomacia do dólar ou da bomba atômica. Os povos que mais sofreram sob a dominação nazista tomam seus destinos em suas próprias mãos e vão consolidando governos progressistas democráticos, realmente nacionais e populares. Os resultados das últimas eleições em vários países europeus, da Bulgária à França, falam bem alto do avanço democrático naquele Continente. De outro lado, ao rápido desenvolvimento da economia soviética que volta ao ritmo dos planos qüinqüenais, corresponde nos grandes países capitalistas a uma reconversão industrial para o tempo de paz acompanhada de brusco descenso na produção, falta de trabalho para milhões de operários, alta dos preços, num surto inflacionário que já anuncia crise de proporções imprevisíveis. Sem dúvida, os restos fascistas, na Espanha e em Portugal, a brutalidade imperialista na repressão aos povos oprimidos em luta pela independência nacional, a cínica intervenção ianque nos negócios internos da China, falam bem alto das tentativas que ainda faz o fascismo por sobreviver. Mas, como já disse Stalin:
«Os povos do mundo não querem a repetição das calamidades da guerra. Lutam com insistência pelo reforçamento da paz e da segurança».
Palavras ainda há poucos dias confirmadas e reforçadas por Jdanov:
«Sempre e sempre, diante do mundo inteiro a União Soviética intervém como a iniciadora na luta por uma paz sólida e efetiva e por uma verdadeira colaboração internacional. Estamos certos de que, quaisquer que sejam as forças opostas ao estabelecimento da paz mundial sólida e da segurança, esta obra, no final de contas, será realizada vitoriosamente. Para essa convicção partimos do fato de que as forças que trabalham em prol da paz aumentam cada dia e repousam em base sólida. Estas forças se tornam cada vez mais organizadas e poderosas. A União Soviética não está sozinha em sua luta por uma paz democrática sólida e pela segurança coletiva dos povos. A política de paz da União Soviética é apoiada por milhões de homens no mundo inteiro.»
E é esta a grande verdade. Basta ter em vista o que seja a obra da Federação Sindical Mundial que une milhões de operários e faz uma política ativa de colaboração mundial. Basta acompanhar os esforços unitários de luta pela paz das mulheres e jovens de todo o mundo agrupados na Federação Democrática Internacional das Mulheres e na Federação Mundial da Juventude Democrática.
A paz é possível e ainda agora, depois de mil ameaças e chantagens nas Conferências da Paz, em Paris, e na das Nações Unidas, em New York, mais uma vez a vontade de paz dos povos do mundo inteiro é vitoriosa. O direito de veto — garantia máxima da unidade dos três grandes, imprescindível à paz — é conservado; o desarmamento mundial tem início com as primeiras medidas para redução e controle; providências práticas contra a tirania de Franco parece que serão afinal adotadas. Sim, a paz é possível, e será mantida enquanto os povos souberem por ela lutar.
Aqui em nossa Pátria a luta pela paz tem um caráter antes de tudo de luta contra a agressividade imperialista, contra os restos do fascismo, pela consolidação da democracia e em defesa da Constituição. Mas essa luta contra a guerra exige cada vez mais um grande e poderoso Partido de massas. Essa a nossa grande e histórica tarefa.
— Por um grande Partido de Massas!
— Pela realização do IV Congresso de nosso Partido, no menor prazo possível!
— Pela paz e a Democracia!
— Pela unidade dos Trabalhadores do Brasil!
— Por um Governo de Confiança Nacional!
— Por um milhão de votos para o PCB em 19 de Janeiro!
— Viva o Brasil Democrático, Independente e Progressista!
— VIVA O PARTIDO COMUNISTA DO BRASIL!
Inclusão | 11/10/2011 |