Eros e Civilização

Herbert Marcuse


Prefácio da Primeira Edição


Este ensaio emprega categorias psicológicas porque elas chegaram a se converter categorias políticas. A tradicional fronteira entre a psicologia, de um lado, e a filosofia social e política, do outro, tornou-se invalidada pola condição do homem na era presente: os processos psíquicos em tempos passados autônomos e identificáveis estão sendo absorvidos pola função do indivíduo no Estado, pola sua existência pública. Portanto, os problemas psicológicos transformam-se em problemas políticos: a desordem particular reflecte mais diretamente do que antes a desordem do todo, e a cura da desordem pessoal depende mais diretamente do que antes da cura da desordem geral. A era propende para ser totalitária, mesmo que não tenha produzido Estados totalitários. A Psicologia pôde ser elaborada e praticada como uma disciplina especial enquanto a psique possa sustentar-se contra o poder público, enquanto a intimidade seja real, verdadeiramente desejada e edificada por ela própria; se o indivíduo não tem a destreza nem a possibilidade de ser por si mesmo, os termos da Psicologia convertem-se nos termos das forças sociais que definem a psique. Nessas circunstâncias, aplicar à Psicologia a análise dos acontecimentos políticos e sociais significa a aceitação de um método que foi invalidado por esses mesmos acontecimentos. A tarefa é, antes, a oposta: desenvolver a substância política e sociológica das noções psicológicas.

Tentei reformular certas questões básicas e acompanhá-las numa direcção não inteiramente explorada ainda. Sou consciente do carácter tentativo desta investigação e espero discutir alguns dos problemas, especialmente os de uma teoria estética, num futuro próximo.

As idéias desenvolvidas neste livro foram apresentadas por vez primeira numa série de palestras proferidas na Escola de Psiquatria de Washington em 1950-51. Quero agradecer ao senhor Joseph Borkin, de Washington, que me encorajou a escrever este livro. Estou profundamente grato ao defunto professor Clyde Kluckhohn, a Barrington Moore, Jr., da Universidade de Harvard, e aos Drs. Henry e Yela Loewenfeld, de Nova York, que leram o manuscrito e me ofereceram valiosas sugestões e críticas. Assumo a responsabilidade exclusiva no que respeita ao conteúdo deste ensaio. Quanto à minha posição teórica, sou devedor ao meu amigo Professor Max Horkheimer e os seus colaboradores do Instituto de Investigações Sociais, agora em Frankfurt.

H. M.


Inclusão 04/09/2008