O método de ascensão do abstrato ao concreto como lei universal cujo desenvolvimento cientifico está sujeito, foi formulada por Hegel. Mas se tornou um método real do desenvolvimento do conhecimento científico concreto somente nas mãos de Marx, que deu a ele uma fundamentação materialista, enquanto que em Hegel, devido a sua interpretação e aplicação idealistas, apareceu exclusivamente como um método para construção de uma ciência especulativa de ciências, um sistema absoluto do “mundo como um todo”.
Marx não somente fundamentou sua lei no plano teórico geral – ele na verdade aplicou no desenvolvimento de uma ciência concreta, economia política. O Capital, criado com a ajuda deste método, contém uma prova prática extensiva e concreta da necessidade deste método, sua fundamentação materialista real como o único método que concordo com a dialética da realidade objetiva.
Análises de O Capital com referência ao método de investigação aplicado nele deveria também mostrar a essência concreta do método de ascensão do abstrato ao concreto.
Deveria ser mostrado como o único método que pode assegurar a solução da tarefa central da investigação científica como é vista na dialética materialista – a tarefa de traçar o condicionante recíproco concreto dos fenômenos, criando, através de sua interação, um sistema que surgiu e se desenvolveu historicamente, e ainda continua a desenvolver novas formas de sua existência e interação interna.
Esta tarefa não pode ser resolvida de qualquer outra forma. Qualquer outro método não corresponde à natureza objetiva do objeto reproduzido com sua ajuda no espírito.
Seria bastante errôneo derivar a necessidade pelo método da ascensão do abstrato ao concreto meramente do fato de que a consciência do homem é incapaz de agarrar o objeto em sua inteira complexidade para que ele possa ascender, quer queira quer não, da noção incompleta unilateral (abstrato) do objeto a um conhecimento cada vez mais completo e compreensivo dele. Esta explicação seria simplesmente bastante inadequada. Para ser mais preciso, esta não é uma explicação, mas uma referência a um fato bem conhecido. A realidade é que a consciência é de fato evidente. Mas todas as propriedades e características específicas da consciência precisam elas mesmas de uma explicação materialista. Além disso, tal referência à natureza da consciência não explicaria qualquer coisa, falando genericamente, sobre a especificidade do método de ascensão do abstrato ao concreto como um método da investigação teórica científica. Familiarização com um objeto, fenômeno ou sistema de fenômenos também toma a forma de assimilação gradual e ordenada de novos detalhes, de transição de uma noção unilateral e escassa de um objeto a uma noção compreensiva (embora ainda empírica) dele. Acumulação de informação empírica através da qual a realidade se torna familiar, mas não ainda conhecida, também procede como desenvolvimento de um conhecimento unilateral a um compreensivo.
Essa interpretação, portanto, levaria em conta somente aquelas características abstratas idênticas, cuja reprodução teórica da concreticidade no conceito tem em comum com a simples familiarização empírica com fenômenos, e não expressaria a especificidade de ambos.
O método de ascensão do abstrato ao concreto é meramente um método de reflexo da realidade concreta no pensamento, ao invés de um método de criação dela pelo poder do pensamento, como foi apresentado por Hegel. É precisamente por isso que não depende do pensamento onde o desenvolvimento lógico de conceitos por ele método vai começar e em qual direção vai proceder. Como Marx mostrou, depende somente da relação na qual os vários aspectos do todo concreto fica uns com os outros. O método do desenvolvimento lógico prefere assim corresponder ao método da divisão interna deste todo, à dialética da formação da concreticidade fora do pensamento, isto é, na análise final, ao desenvolvimento histórico dessa concreticidade, embora, como será mostrado mais tarde, esta coincidência não é de forma alguma simples, morta ou espelhada, sendo causa somente com os momentos universais do desenvolvimento.
A fórmula do materialismo na epistemologia e lógica é o inverso do que tem sido formulado: o objeto é tal que somente o dado, ao invés de alguma outra forma de atividade da consciência corresponde a ele; o objeto é tal que ele só pode ser refletido na consciência com a ajuda do método dado.
Em outras palavras, a discussão do modo da atividade lógica aqui, também, se torna o estudo da natureza objetiva da realidade objetiva, uma elaboração adicional da categoria da concreticidade como uma categoria objetiva expressando a forma universal da existência da realidade.
Aqui, também, o princípio da coincidência da lógica, epistemologia e dialética, é o dominante: a questão que é puramente lógica, à primeira vista, é essencialmente uma questão de formas universais nas quais a concreticidade objetiva surge e se desenvolve.
Uma fundamentação materialista da concreticidade e necessidade do método de ascensão do abstrato ao concreto pode consistir somente em demonstrar as leis universais reais que dominam igualmente a formação de qualquer sistema concreto de fenômenos interagindo (seja ele o sistema capitalista de relação sociais ou o sistema solar, a forma química ou biológica de interação etc.).
Aqui novamente nos deparamos com uma dificuldade dialética familiar: a abordagem da dialética é em si mesma dialética. É aparentemente impossível estabelecer e expressar teoricamente as leis universais da formação de qualquer concreticidade no caminho da generalização indutiva, de abstração das características gerais e idênticas que o sistema capitalista tem em comum com o sistema solar e a forma biológica de interação na natureza com a eletromagnética ou química.
Formulando a questão desta maneira significa definir uma tarefa absolutamente insolúvel em sua própria natureza. Humanidade como um todo não conhece todos os casos de interação concreta na natureza infinita, muito menos o presente autor. Contudo, obstante nos deparamos com a tarefa de estabelecer exatamente as leis universais (isto é, lógicas) da formação de qualquer sistema objetivo de interação concreta. Em outras palavras, nós recorremos a um dos problemas eternos da filosofia – se é possível resolver uma generalização realmente universal, infinita com base no estudo de uma série limitada e necessariamente finita de fatos, e se é assim, como alguém pode abordar a tarefa.
Por sorte, a filosofia a filosofia nunca tentou obter este entendimento dentro da abordagem indutiva. O real desenvolvimento da ciência e filosofia há muito tempo achou uma forma prática de resolver esta antinomia, que apenas parece insolúvel a princípio enquanto for formulado metafisicamente.
Na verdade, a humanidade tem sempre obtido generalizações e conclusões universais, “infinitas”, não somente na filosofia, mas em qualquer área do conhecimento também, através de análises de pelo menos um caso típico, e não através de abstração daquelas características idênticas que todos os casos comuns possuem em comum.
É suficiente nesta conexão relembrar as palavras da Dialética da Natureza, de Engels:
Um exemplo notável do que há de injustificado na pretensão segundo a qual a indução é a forma única ou ainda predominante da investigação científica, pode ser encontrado no terreno da termodinâmica: a máquina a vapor constituía a demonstração mais assombrosa de que, do calor, é possível extrair-se movimento mecânico. Mas a verdade é que 100.000 máquinas a vapor não o demonstram melhor que uma; criam apenas, para os físicos, a necessidade cada vez maior de explicar o fenômeno. Sadi Carnot foi o primeiro que se propôs a fazê-lo com seriedade. Mas não por meio da indução. Estudou a máquina a vapor, analisou-a, e verificou que o processo de seu funcionamento, aquilo que nela interessava, não se encontrava sob uma forma simples, mas encoberto por uma série de processos secundários; pôs de lado todas as circunstâncias estranhas ao processo essencial e construiu uma máquina a vapor, ideal (ou máquina a gás), de construção, por certo tão difícil como, por exemplo, uma linha ou superfície geométrica, mas que, de certa maneira, presta o mesmo serviço que essas abstrações matemáticas: apresentava o processo sob uma forma simples, independente, não adulterada (Engels, 2000, p. 166)Referência 1.
Não é indução direcionada à busca de abstrações expressando as características gerais de todos os casos particulares, mas análises em profundida de um caso particular visando revelar o processo em estudo em sua forma pura que tem sido o método da filosofia quando e onde ela realmente chegou a descobertas objetivas. São somente homens como Comte e Spencer que tentar seguir o caminho da indução e abstração – com resultados adequadamente escassos.
A filosofia tem sempre se preocupado com seus próprios problemas específicos essencialmente diferentes do desejo de encontrar as características gerais abstratas que um crocodilo tem em comum com Júpiter e o sistema solar com riqueza. A filosofia tem sempre tido seus próprios problemas sérios, a solução disso colocou-a mais próxima do estabelecimento de leis universais de tudo que existe, revelando o conteúdo das categorias.
Marx, como é bem conhecido, fez uma análise crítica do sistema hegeliano de categorias universais, mas ele não fez isso comparando estas categorias com características que a humanidade tem em comum com o núcleo atômico ou com a estrutura e grandeza do Universo.
O sistema de Hegel foi superado criticamente através de sua comparação crítica basicamente com uma instância do desenvolvimento dialético (mas, o que é mais importante, a mais típica delas) – com a dialética das relações sociais de produção em um estágio de seu desenvolvimento.
Uma superação crítica das categorias universais historicamente desenvolvidas pela filosofia, com referência a pelo menos um caso típico, é o verdadeiro caminho que é sempre tomado pela evolução do entendimento do conteúdo das categorias universais.
A tarefa básica da análise teórica do universal é sempre reduzir verdadeiramente à análise do individual, na perspectiva do universal. Só é possível apontar no individual aquilo que constitui a universalidade deste caso, ao invés de sua individualidade ou especificidade. É neste ponto que é necessária uma atitude consciente de abstração e o método de sua obtenção. O erro mais ordinário da investigação teórica é feito quando aquilo que realmente se refere à ocorrência dada das circunstâncias transientes na qual uma forma universal real é contemplada, é tomada como a própria forma universal do fato individual.
Para revelar o conteúdo de tal categoria universal como concreticidade, pode-se e deve-se estudar ao menos um caso típico do sistema vivo dialeticamente desenvolvido dos fenômenos objetivos interagindo internamente.
O sistema de relações capitalistas entre homens é o exemplo mais típico de tal sistema relativamente independente se autodesenvolvendo (concreticidade). Nós devemos considerar isso como um caso particular imediato da concreticidade em geral, na qual o delineamento universal de qualquer concreticidade pode e deve ser revelada. Materiais de outros campos serão considerados à medida na qual eles são característicos em si mesmos.
A escolha deste material é determinada por outras razões que não capricho subjetivo ou inclinação pessoal. Uma consideração de muito mais peso em favor desta escolha é que nenhuma outra concreticidade tem sido compreendida tão profundamente quanto essa. Nenhum outro sistema de interação concreta tem sido apresentada ao intelecto na inteira complexidade e plenitude de sua dialética interna, na inteira complexidade de sua estrutura como o sistema das relações capitalistas reveladas em O Capital e outros trabalhos dos fundadores do marxismo-leninismo, e é exatamente por isso que é mais conveniente usar este material como a base para considerar as características universais de qualquer concreticidade, para explicar a categoria da concreticidade em geral.
Este modo de consideração coincide plenamente com o que o próprio Marx fez em sua prática cognitiva.
Quando Marx se deu a tarefa de revelar a lei universal do capitalismo enquanto tal, como um sistema historicamente determinado de produção social, ele não tomou o caminho da comparação indutiva de todos os casos, sem exceção, do desenvolvimento capitalista que tomou lugar no planeta em seu tempo. Ele agiu diferentemente, como um dialético: ele tomou o caso mais característico e melhor desenvolvido, nomeadamente, a realidade capitalista da Inglaterra e seu reflexo na literatura econômica inglesa e desenvolveu uma teoria econômica universal, basicamente com base na investigação detalhada desse exemplo único.
Ele entendeu que as leis universais do desenvolvimento do capitalismo são as mesmas para qualquer país, e que a Inglaterra, tendo avançado mais longe do que qualquer outro país no caminho do desenvolvimento capitalista, demonstrava todos os fenômenos em sua forma mais distinta. Tudo aquilo que em outros países estava presente como um rudimento muito fraco e dificilmente distinguível, como uma tendência que não estava ainda plenamente formada, obscurecida e complicada por circunstâncias secundárias externas, existia aqui na forma mais desenvolvida e classicamente definida. Somente em algumas ocasiões Marx utilizou materiais relativos ao desenvolvimento capitalista de outros países (em sua análise da renda, por exemplo, ele usou numerosos materiais do desenvolvimento econômico de uma cidade russa). Desta forma, a forma de estabelecimento de características imediatamente comuns de diferentes exemplos do desenvolvimento capitalista, não era uma estrada real para chegar a uma teoria universal do desenvolvimento capitalista. A estrada real de sua investigação foi invariavelmente o estudo da realidade econômica inglesa e uma crítica construtiva da economia política inglesa.
As mesmas considerações poderiam aparentemente ser levadas em conta ao enfrentar o problema das categorias da dialética como lógica e epistemologia, como a ciência do pensamento. É a realidade capitalista teoricamente revelada em O Capital e outros trabalhos do mesmo ciclo (tanto por Marx e por seus melhores pupilos e seguidores, em primeiro lugar por Engels e Lenin) que fornece a imagem mais compreensiva da concreticidade historicamente emergente e desenvolvida, como o exemplo mais típico da concreticidade em geral. É O Capital que nós consideramos como o modelo até então inigualável da aplicação consciente do método dialético, da lógica dialética na plenitude de seu conteúdo. Ele mostra a muitas ciências seus próprios futuros, demonstrando em uma forma classicamente bem definida todos aqueles aspectos do método que ainda não haviam sido realizados em outras ciências da mesma maneira consistente.
Poderia também ser apontado que a crítica construtiva de teorias prévias – um momento necessário da elaboração teórica dos problemas científicos de nossos tempos – assume que criticamente assimilado é o material teórico (mental) de melhor qualidade, os verdadeiros melhores modelos da compreensão teórica da realidade que aparece no caso dado como o objeto da atenção e investigação.
Enquanto Marx desenvolvia sua teoria econômica, os principais oponentes teóricos com quem ele discutia ao elaborar sua compreensão da realidade, eram os representantes clássicos da economia política burguesa, ao invés dos representantes contemporâneos da economia vulgar e da “forma professoral de decaimento” da teoria. Os últimos eram contemporâneos de Marx só cronologicamente, não na perspectiva da compreensão teórica do assunto. Em consideração a teoria, eles eram infinitamente inferiores aos clássicos e não eram de forma alguma uma oposição teórica digna de argumentos sérios. Desdobrando sua compreensão teórica da realidade na forma de argumentos sérios com os clássicos, Marx meramente ridiculariza, sempre que a ocasião justifica, tais “teóricos” como Senior, Bastiat, MacCulloch, Roscher etc. Criticando estes últimos era somente apropriado quando a compreensão teórica do assunto já havia sido desdobrada em sua essência.
Na medida em que as categorias filosóficas, as categorias da dialética, estão em causa, a filosofia clássica burguesa ainda permanece como único oponente teórico sério e digno da filosofia do materialismo dialético, que, entretanto, não elimina absolutamente a tarefa de lutar contra o sistema burguês moderno, mas, ao contrário, ajuda a revelar seu desejo de escapar os grandes problemas filosóficos.
A atitude de Marx, Engels e Lenin com relação a Hegel ou Feuerbach foi fundamentalmente diferente de sua atitude com relação a Schopenhauer, Comte, Mach ou Bogdanov. Criticando fortemente as especulações dos idealistas insignificantes, eles nunca nem tentaram procurar por um núcleo racional em seus escritos.
Ao denunciar a argumentação sofista confusa dos machistas, Lenin primeiro de tudo reduz isso à expressão de princípios e classicamente transparente que foram dados a estes pontos de vista por Berkeley e Fichte. Esta não é meramente uma manobra polêmica, mas a melhor forma de desvendar teoricamente a essência de sua posição. Por outro lado, quando Lenin enfrenta a tarefa de elaboração posterior da dialética materialista, ele deixa de lado os Machistas, como adeptos teóricos de Berkeley, e volta a uma análise crítica da Ciência da Lógica de Hegel, como o auge real do pensamento burguês em compreender as leis universais da natureza, sociedade e pensamento humano.
O que está acima pode ser resumido como segue: uma fundamentação genuinamente concreta do método de ascensão do abstrato ao concreto como o único método cientificamente correto do desenvolvimento lógico, como o único método correspondendo à dialética objetiva, deveria ser procurada em O Capital de Marx, na análise de sua estrutura lógica.
Lógica, epistemologia e dialética coincidem consistentemente em O Capital, e essa coincidência sistemática, a coincidência da indução e da redução, da análise e da síntese, caracterizando o método de ascensão do abstrato ao concreto, é a característica distintiva do método de investigação de Marx. Vamos primeiro considerar o problema em sua expressão econômica concreta, e então proceder às conclusões lógicas e metodológicas gerais.
Deixe-nos fazer essa questão: é em geral possível entender teoricamente (reproduzir conceitualmente) a essência objetiva de tais fenômenos como mais-valor e lucro se a categoria do valor não havia sido previamente e independentemente analisada? O dinheiro pode ser entendido se as leis governando o movimento do mercado mercantil simples não são conhecidas?
Aqueles que leram O Capital e estão familiarizados com os problemas da economia política estão conscientes de que essa é uma tarefa insolúvel.
Alguém pode formar um conceito (uma abstração concreta) do capital através de generalização puramente indutiva das características abstratas observadas em qualquer dos vários tipos de capital? Tal abstração será satisfatória do ponto de vista científico? Tal abstração expressará a estrutura interna do capital em geral, como uma forma específica da realidade econômica?
Tão logo fazemos a questão nesta forma, a necessidade por uma resposta negativa a ela se torna aparente.
Esta abstração expressará, naturalmente, as características idênticas que capital industrial, financeiro, comercial e usurário tem em comum. Ela indubitavelmente nos libertará de repetições. Mas isso exaurirá seu verdadeiro potencial cognitivo. Não expressará a essência concreta de qualquer um desses tipos de capital. Ela vai apenas expressar pouco a essência concreta de sua conexão mútua, sua interação. Essas são precisamente as características das quais uma abstração é feita. Mas, a partir da perspectiva da dialética, é exatamente a interação concreta dos fenômenos concretos que constituem o assunto e o objetivo do pensamento em conceitos.
O significado do geral é contraditório, como Lenin apontou; ele enfraquece a realidade viva, mas ao mesmo tempo é o único movimento possível em direção a sua compreensão. No exemplo dado, entretanto, é fácil ver que o geral não faz nada além de enfraquecer o concreto, se afastando dele e não sendo ao mesmo tempo um passo em sua direção. É a partir do concreto, assim como do “não essencial”, que este geral é uma abstração.
Esta abstração também não expressa a natureza universal do capital (de qualquer capital – industrial, financeiro ou comercial).
O Capital de Marx demonstra em uma forma bastante explícita que a natureza econômica concreta do capital comercial, como um aspecto concreto do todo capitalista, não pode, em princípio, ser entendida ou expressa em abstração teórica a não ser que o capital industrial seja previamente entendido em sua estrutura interna.
Considerar as definições imanentes do capital industrial é o esmo que revelar a essência do capital em geral. É tão indubitável quanto que o capital industrial não pode ser entendido antes do valor.
[...] a taxa de lucro não é fácil de ser compreendida quando se conhecem as leis do mais-valor. Do contrário, não se compreende ni l’un, ni l’autre [nem uma, nem outra] (Marx, 2013, p. 292, nota 28)Referência 2.
Vamos enfatizar que o ponto aqui é compreender (expressando em um conceito), pois isso é, naturalmente, bastante possível para criar a abstração do lucro em geral. No último caso é suficiente reduzir os fenômenos empiricamente observados do lucro a uma expressão abstrata. Essa abstração será bastante adequada para distinguir com certeza entre os fenômenos do lucro e outros fenômenos, para “reconhecer” o lucro. Isso é feito com bastante êxito por todo empreendedor, que pode muito bem distinguir entre lucro e salários, dinheiro e assim por diante.
Ao fazer isso, o empreendedor não entende, entretanto, o que é o lucro. Ele também não precisa disso. Na prática, ele age como um adepto instintivo da filosofia positivista e lógica empírica. Ele meramente empresta uma expressão generalizada aos fenômenos que são importantes e essenciais do seu ponto de vista, a partir da perspectiva de seus objetivos subjetivos, e essa expressão generalizada dos fenômenos serve excelentemente a ele na prática como um conceito, permitindo-o distinguir entre o lucro certo e o não-lucro. Como um positivista honesto-a-deus, ele acredita sinceramente tudo que se fala sobre a natureza interna do lucro, sobre a essência e substância deste fenômeno, tão caro ao seu coração, ser um sofisma metafísico, filosofia divorciada da vida. Sob as condições da produção capitalista, o empreendedor não precisa saber qualquer coisa disso. “Qualquer um pode usar dinheiro como dinheiro sem necessariamente entender o que o dinheiro é” (Marx, 1975a, p. 163)Referência 3.
O intelecto prático limitado, como Marx enfatizou, é basicamente alheio e hostil à compreensão (ver o comentário sobre Friedrich List no Capítulo Um de Contribuição à Crítica da Economia Política).
Isso pode ser até mesmo nocivo ao empreendedor a filosofar sobre o problema do lucro. Enquanto ele está tentando entende-lo, outro, operadores ambiciosos mais espertos e mais práticos, vão arrebatar a sua quota de lucro. Um homem de negócios nunca trocará lucro real por um entendimento do que o lucro é.
Na ciência, na argumentação, entretanto, compreensão é importante. Ciência como pensamento em conceitos começa somente onde a consciência não expressa simplesmente, em outras palavras, as concepções das coisas espontaneamente empurradas sobre ela, mas sim tentativas de analisar coisas e concepções das coisas em um objetivo direto e de maneira crítica.
Compreender um fenômeno significa estabelecer seu lugar e papel no sistema concreto de fenômenos interagindo no qual ele é necessariamente realizado, e encontrar precisamente aqueles traços que fazem isso possível ao fenômeno desempenhar seu papel no todo. Compreender um fenômeno significa descobrir o modo de sua origem, a regra de acordo com a qual o fenômeno surge com a necessidade enraizada na totalidade concreta de condições, significa analisar as próprias condições da origem dos fenômenos. Essa é a fórmula geral para a formação de um conceito e da concepção.
Compreender o lucro significa estabelecer a natureza universal e necessária de sua origem e movimento no sistema da produção capitalista, revelar seu papel específico no movimento global do sistema como um todo.
É por isso que o conceito concreto só pode ser realizado através de um sistema complicado de abstrações expressando o fenômeno na totalidade de condições de sua origem.
A economia política como uma ciência começa historicamente onde fenômenos recorrentes (lucro, salários, juro etc.) não são meramente registrados, em termos das designações geralmente entendidas e geralmente aceitas (isso tem lugar antes da ciência e fora da ciência, na consciência dos participantes práticos da produção), sendo compreendidas concretamente, através da análise de seu lugar e papel no sistema.
Assim, é em princípio impossível compreender (expressar em um conceito) o lucro, a não ser que o mais-valor e as leis de sua origem sejam compreendidos previamente e independentemente do primeiro.
Por que isso é impossível? Se nós respondermos essa questão em uma forma teórica geral, nós vamos mostrar assim a necessidade real do método de ascensão do abstrato ao concreto, sua aplicabilidade a qualquer campo do conhecimento.
Vamos, portanto, nos voltar à história da economia política.