Entrevista ao Jornal Grego Rizos-Pastis, Órgão Central do PC Grego

Vasco Gonçalves

1 de Maio de 1975


Fonte: Vasco Gonçalves - Discursos, Conferências de Imprensa, Entrevistas. Organização e Edição Augusto Paulo da Gama.
Transcrição: João Filipe Freitas
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Fernando A. S. Araújo.

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PerguntaV. Ex.ª é, parece-me, militar de carreira, de profissão. Como explica o facto de, os militares aqui, como V. e os seus colegas, se tenham tornado pela sua acção, libertadores do vosso povo, da longa tirania fascista, ao passo que na Grécia, os militares de profissão, os Coronéis, submeteram o povo grego à mais selvagem tirania?

A que atribui isto?

É uma diferença de carácter nacional, de formação cultural ou política, ou pelo contrário, é devido a outra coisa?

Resposta — Como sabe, a história não se repete e o facto de na Grécia os coronéis terem desempenhado um papel reaccionário correspondeu, para além de outros factores, a uma fase determinada de desenvolvimento da sociedade grega, assim como o facto de os oficiais portugueses se terem revelado, em Abril de 1974, progressistas — depois de 13 anos em que estiveram empenhados em guerras de opressão —, corresponde a uma série de condições específicas da sociedade portuguesa. Na formação da consciência revolucionária dos oficiais portugueses entrelaçam-se factos como a luta do Povo Português contra o fascismo, uma tradição de luta anti-fascista dentro das próprias forças armadas, luta essa que passou por várias tentativas falhadas de derrubamento do fascismo pela força, os 13 anos de guerra em África onde a consciência de que lutávamos por uma causa injusta foi amadurecendo.

Desempenhou ainda papel importante na nossa tomada de consciência a verificação, após as últimas eleições promovidas pelo regime de Caetano, que o fascismo português não tinha possibilidade de auto-reforma; ou seja que mesmo evoluindo não tinha capacidade de ir assumindo forma democrática. Ligado a este facto andava a obstinação do regime fascista que pretendia resolver militarmente uma guerra que nós, que lá andávamos, sabíamos só ter solução política. Desempenhou ainda papel fundamental na nossa tomada de consciência a crise profunda por que passava a sociedade portuguesa.

Problemas de carácter profissional estiveram na origem das primeiras reuniões do MFA, mas passados os primeiros tempos, verificámos que as raízes dos problemas mergulhavam bem mais fundo, vimos que o que estava em causa era o regime fascista e preparámos o seu derrubamento.

Em 25 de Abril de 1974 cumprimos o nosso objectivo desde logo apoiado calorosamente pelo Povo Português.

PerguntaVós falais aqui duma aliança Povo-MFA. Muito bem. Todavia daí resulta uma questão: quem garante que o MFA (ou as forças armadas em geral) vai marchar sempre em bom entendimento com o povo português?

Não há perigo que mais tarde apareçam elementos Termidorianos-Bonapartistas?

Resposta — E é justamente na aliança do Povo com o MFA que repousa a originalidade do processo português e a garantia do seu prosseguimento e consolidação.

A pergunta que me faz revela uma certa perplexidade e corresponde a uma posição bastante generalizada entre os observadores da realidade portuguesa, mesmo de sectores progressistas.

Devo dizer-lhe que para se compreender o processo revolucionário português é quase indispensável vivê-lo ou pelo menos estudá-lo muito profunda e atentamente.

Quanto à última parte da sua pergunto respondo negativamente e justifico. Quando há um Movimento de Forças Armadas que reclama para o seu País a opção socialista e vê essa opção abraçada pelo Povo a que pertence, quando o Movimento das Forças Armadas alberga no seu seio oficiais, sargentos e praças organizados e conscientes da missão que lhes compete, não vejo espaço para o aparecimento vitorioso de elementos Termidorianos—Bonapartistas.

Na prática da aliança Povo-MFA reside a nossa contribuição, original, para a teoria revolucionária. No alargamento dessa aliança quer dentro das próprias Forças Armadas, quer no seio do Povo reside a certeza da vitória final do Povo Português.

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Abriu o arquivo 05/05/2014