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Primeira Edição: Publicado originalmente em Die Neue Zeit, 13 (2), 1894-95, p. 228-233, 6 de maio de 1895
Fonte: Jornal GGN - https://jornalggn.com.br/artigos/bernstein-e-a-homofobia-por-marcos-silva/
Tradução: Arlene Clemesha
Transcrição e HTML: Fernando Araújo.
Alguns filósofos e psicólogos do século XX anunciaram explicitamente “encontros” entre a tradição marxista e o legado freudiano. A simples menção a títulos como Eros e Civilização (Herbert Marcuse), O Combate Sexual da Juventude (Wilhelm Reich) ou Meu Encontro com Marx e Freud (Erich Fromm) evidencia o quanto aquele diálogo pesou em debates socialistas do século passado.
O texto de Eduard Bernstein “O Julgamento de uma Relação Sexual Anormal” atesta a profundidade e o pioneirismo de seu debate sobre o desejo como cultura, antes de aqueles “encontros” terem sido registrados; antes, portanto, de uma maior divulgação dos textos freudianos para além dos meios médicos austríacos e de uma vontade socialista de ampliar seu espaço de discussão, através do diálogo com outras tradições críticas.
Partindo do processo contra Oscar Wilde, que resultou em condenação e aprisionamento do escritor, Bernstein tece importantes considerações a respeito da dimensão histórica do erotismo humano. Daí, o socialista alemão falar em sexo “anormal”, e não “antinatural”. Deixa de lado a noção de natureza, para trabalhar com o conceito de norma, dotada explicitamente de historicidade. Afasta-se, dessa forma, de uma apropriação moralizante da natureza e procura, de maneira anti-preconceituosa, entender a sexualidade “anormal” como manifestação do desejo enquanto expressão cultural e histórica. Vale lembrar que o mesmo texto demonstra grande preocupação com os direitos da mulher, tema presente em outros de seus escritos.
Bernstein não era voz isolada, entre os social-democratas alemães, nessa atitude antipreconceituosa. Desde 1898, August Bebel apoiou a proposta do Comitê Científico-Humanitário (movimento homossexual alemão, fundado no ano anterior, que atuou até à ascensão do nazismo) para abolir a lei que criminalizava a homossexualidade na Alemanha; em 1905, Adolf Thiele se juntou a Bebel naquela defesa, sendo sua proposição derrotada no Parlamento, a partir da ação de liberais e conservadores.
A posição de Bernstein e outros socialistas alemães sobre a sexualidade humana, relida hoje, assume especial importância no sentido de incluir essa dimensão da experiência de homens e mulheres na pauta do debate político; e enfrenta preconceitos que ainda se manifestam em setores sociais ou até em governos que se dizem socialistas e esclarecidos.
Reler esse texto no momento em que o STF brasileiro criminaliza homofobia e transfobia mas garante o direito a sua prática em templos religiosos (quer dizer: libera o crime em nome de Deus) pode contribuir para novos debates sobre a questão.
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O “Caso Wilde” ainda não chegou a um fim judicial. Como o júri não conseguiu chegar a um acordo a respeito de uma questão vital, ele será realizado dentro de alguns dias, perante um novo júri. As divergências entre os júris mui bem refletem a opinião pública mais recente. No início, a opinião pública não conseguiu gritar “crucifiquem-no” com suficiente força. Mas depois, em vista da baixa qualidade das testemunhas de acusação, cresceu o número dos que esperavam que Wilde fosse inocentado, mesmo que responsável pelos delitos de que foi acusado. Um clérigo – socialista-cristão, o Reverendo Selwyn Image – encontrou até a coragem para descrever toda a legislação empregada na acusação Wilde como perniciosa, e exigir sua revogação, em uma carta ao Reformador da Igreja.
A Alemanha é um dos poucos países a condenar a ofensa de que Wilde é acusado. No que concerne à hipocrisia moral, ela não fica muito a dever para a Inglaterra. Mas, para não desviar do assunto: existem ainda grandes diferenças de opinião, inclusive dentro do movimento social-democrata alemão, quanto à posição que a sociedade deveria adotar em relação às práticas sexuais que não se inserem no âmbito do que é considerado normal. Não importa o quanto o partido tenta julgar outras questões da vida pública de uma maneira científica e não preconceituosa, quando assuntos sexuais estão em pauta, há poucos sinais de uma tentativa para conquistar e manter um ponto de vista firme, moderno e cientificamente fundamentado. Há mais pré-julgamento do que julgamento e o libertarismo extremo, emprestado do radicalismo filosófico, alterna-se com uma moralidade ultrapuritana, quase farisaica. Mesmo que o tema do comportamento sexual não tenha tanta importância para a luta econômica e política da social-democracia, a busca de uma forma objetiva de abordar também esse aspecto da vida social não é irrelevante. Seria necessário descartar todo julgamento baseado em conceitos morais mais ou menos arbitrários, em favor de um ponto de vista que derive da experiência científica. Hoje, o Partido tem força suficiente para influenciar o formato das leis do Estado. Os seus oradores e sua imprensa influenciam tanto a opinião pública como os membros e seus contatos. O Partido já tem uma certa responsabilidade sobre o que acontece hoje. Portanto, faremos a seguir uma tentativa para abrir o caminho rumo a semelhante aproximação científica do problema.
Em primeiro lugar, algumas observações sobre a expressão que escolhemos: “relação sexual anormal”. A expressão normalmente empregada, como se sabe, é “não natural”. Mas isso em si conduz a um erro. Em que ela seria “não-natural”? Toda a nossa existência cultural, nosso modo de vida da manhã até à noite, constitui uma ofensa constante à natureza, às precondições originais de nossa existência. Se fosse apenas uma questão do que é natural, então os piores excessos sexuais não estariam mais sujeitos à objeção do que, digamos, o ato de escrever uma carta – já que o ato da relação social através da palavra escrita está muito mais distante da natureza do que qualquer meio até hoje conhecido para satisfazer o desejo sexual. Não se observa, entre os animais (geralmente os domésticos e cativos, é claro, mas estes ainda estão significativamente mais próximos da natureza do que o próprio homem) e entre os chamados povos naturais, práticas de satisfação do desejo sexual que seriam coloquialmente designadas “não naturais”? A expressão convencional é tão ilógica, nesse caso, quanto o próprio veredicto convencional. Sujeitemos isso agora à crítica.
“Anormal” parece-nos uma expressão bem mais apropriada do que “não natural”. No que concerne ao assunto atual, o conceito de normalidade contém, do conceito de natural ou correto, tanto quanto seria necessário para uma análise pertinente, sendo que é ainda mais flexível. O seu emprego também corresponde melhor ao fato de que os pontos de vistas morais são manifestações históricas, não são guiados pelo que se supõe ter havido no estado natural, mas sim pelo que é considerado normal por si mesmo em um dado estágio do desenvolvimento social.
No entanto, não estamos negando que os humanos sempre viram como sendo a forma normal de atividade sexual aquela que corresponde à tarefa de propagação da espécie humana. Até aí, inclusive os humanos estão amarrados à lei da natureza. Mas houve épocas e culturas nas quais extensas camadas populacionais viram essa tarefa como uma idéia irreal; nas quais a lei da natureza deixou de ser a norma. Sendo que algo se pode dizer acerca da maioria das nações civilizadas: que em um número crescente de casos, o chamado ato de acasalamento não apenas não está relacionado à reprodução da raça humana, mas que esta é vista como uma decorrência francamente indesejada e, sempre que possível, evitada. Formalmente, o ato original de acasalamento está solidamente afirmado como sendo a norma mas, na prática, a relação sexual é realizada por puro prazer e porque foi emancipada da procriação, é altamente não-natural e até contra-natural. No entanto, a lei e o costume não interferem nisso, mas proscrevem e punem apenas certos tipos de relação sexual, nas quais desaparece até mesmo a aparência de uma relação com a procriação – que, de fato, não são apenas contrárias à natureza, mas contrárias à normalidade, que correm contra a firmemente fictícia norma estabelecida. Mas pode este ponto de vista ser sustentado?
Não possuímos um bom conhecimento da relação entre o estado da sociedade em geral e a organização da vida sexual em particular. Não obstante a quantidade de escritos sobre o tema das formas de atividade sexual, ao que se sabe ninguém realizou, nesse assunto, algo semelhante à exposição de Morgan, sobre as relações entre as formas de família e o desenvolvimento da produção. Antropólogos e etnógrafos produzem relatos sobre sociedades selvagens e semi-selvagens, nas quais manifestações sexuais de todos os tipos não são reprimidas nem punidas e outras, nas quais são expiadas através de punições que chegam à pena de morte: Parece óbvio que as diferentes visões do que é ou não permitido em uma relação sexual se originam sempre nas diferentes condições da vida sexual mas, via de regra, acreditou-se que bastava estabelecer os fatos, sem aprofundar a investigação em busca das causas. Naturalmente, não se deixou de perceber que manifestações, como a sodomia, ocorrem principalmente ou quase exclusivamente entre os povos pastoris e camponeses; além disso, constitui lugar-comum a noção de que os excessos sexuais aumentam com o próprio aumento da riqueza e do luxo. Mas inclusive essa noção requer uma boa dose de qualificação. As riquezas são acumuladas em circunstâncias muito diferentes e em condições sociais muito diferentes, através de comércio, pirataria, indústria, com o auxílio de uma economia escravocrata e pela exploração dos trabalhadores livres. Relacionadas a isso, surgem as diferentes condições para a prática e satisfação de prazeres sexuais anormais. As sociedades antigas, cujas riquezas derivavam da economia escrava e do comércio, aparentemente tentaram, nesse campo, tudo o que a imaginação pode conceber. A ponto de um defensor moderno da liberdade sexual, ao referir-se à Hermaphrodi de Antonius Panormitia – uma coleção do século XV das passagens pornográficas nas obras dos antigos – poder dizer que aqueles deixaram para a posteridade “muito pouco a acrescentar” (HELLMAN. Geschlechtsfreiheit (Liberdade sexual), p. 177). De fato, as experiências em escravos e crianças escravas, permitidas na Roma imperial, seriam hoje impensáveis. Elas pressupunham um grau de descaso pela vida humana que hoje só encontramos em mentalmente desequilibrados.
A nossa intenção não é ignorar os sacrifícios contemporâneos do altar da avareza, que caem sob outra categoria. Quanto ao restante, deixemos que as condições de moralidade em uma cidade comercial moderna sejam comparadas com aquelas em nossas cidades industriais. Não teremos necessariamente menos excessos sexuais nestas, mas serão de diferente tipo, assim como será diferente toda a organização da relação sexual. De maneira geral, nos países de cultura avançada, está em curso uma uniformização ainda mais poderosa das aparências sociais. A facilitação sem precedentes do comércio e o grande crescimento da concorrência estão favorecendo a eliminação das diferenças mais profundas.
Voltando ao tema, os romanos seguiram os passos dos gregos e estes seguiram os egípcios e diversos povos asiáticos, na prática de relações sexuais anormais. Não podemos mais que especular sobre a sua origem. É provável que, no início, a ausência de possibilidades para a satisfação do desejo sexual de maneira normal levou as pessoas a atos anormais de prazer sexual. Ausência esta que pode ser o produto de diversas circunstâncias. Mas não podemos aqui avançar nesse assunto. Devemos apenas constatar que a relação sexual anormal é tão antiga, tão difundida, e pode ser encontrada em nível cultural tão diverso, que não se pode dizer com um mínimo grau de segurança que tenha estado ausente em algum estágio do desenvolvimento cultural humano. Da mesma forma, a teoria, muito repetida, que atribui a prática mais freqüente da relação sexual anormal aos períodos de decadência, não se sustenta. Hellman, acima citado, de fato escolheu mal o seu exemplo quando sugeriu a era grega de Péricles como prova do contrário, pois foi, sem dúvida, justamente o período de Péricles que se sobressaiu na decadência de Atenas; não devemos nos deixar enganar pelo grande florescimento da arte desse período, pois a arte é, em geral, um guia muito traiçoeiro para se medir a vitalidade de um povo. Mas os atenienses estavam praticando o amor masculino bem antes de Péricles, o que não impediu o seu crescimento nacional. Mais do que isso, aquele e costumes semelhantes existiram entre outros povos em períodos de verdadeiro crescimento. (Der Konträrsexuale vor dem Strafrichter [Sexo antitético e o juiz da Corte Criminal]. Leipzig e Viena: Franz Deuticke, 1894, 38 págs).
Sabe-se mais sobre a oposição aos prazeres sexuais anormais do que sobre a sua própria difusão, pelo menos no que concerne aos povos civilizados. Aqui, um aspecto é muito característico. Já mencionamos que a relação sexual normal consta através dos tempos como tendo existido para fins de procriação, isto é, a união sexual de dois indivíduos maduros de gêneros opostos. Mas encontramos, desde períodos muito remotos, além da masturbação, a utilização, para o prazer sexual, de outros órgãos além daqueles fisiologicamente determinados para o ato sexual, sejam pertencentes a um indivíduo do mesmo sexo ou do sexo oposto. Até o presente, a lei praticamente ignorou os tipos de relação sexual anormal pertencentes à primeira categoria. Como se trata totalmente de uma questão do homem usando o corpo da mulher, então não é nenhum exagero dizer que a lei trata o corpo da mulher – exceção feita ao estupro e danos físicos – como algo que seria impossível de se mal-utilizar sexualmente. A prática do amor homossexual feminino também foi ignorada na maioria dos lugares e na maioria das épocas. Muito diferente, foi a atitude para com a relação homossexual entre membros do sexo masculino. Esta foi rigorosamente punida entre os povos negros. Moisés a proibiu para os judeus (Livro Terceiro de Moisés, cap. 18, 20), Sólon para os escravos, Justiniano começou a puni-lo no Estado romano e, finalmente, a Lex Carolina estabeleceu a pena de morte para as práticas de paedicatio (abuso do ânus) em homens e mulheres, preceito este mantido da Idade Média até os dias de hoje.
Temos diante de nós o livro do professor vienense, von Krafft-Ebing, do qual obtivemos os fatos acima citados. Intitula-se Der Konträrsexuale vor dem Strafrichter, e nele o autor se expressa como se aqueles fatos indicassem um tratamento preferencial ao sexo feminino; pelo menos, fala da injustiça representada pela imunidade das mulheres comparada à punição da atividade homossexual entre homens. Vemos o assunto de outra forma: parece-nos que a liberdade atribuída ao corpo feminino caracteriza o desprezo pela mulher, implementado com o surgimento do patria potestade. É muito compreensível que uma era posterior, racional, fosse responsável por essa diferenciação, da forma como ela aparece para Krafft-Ebing, à luz do código penal moderno, mas esta racionalização não elimina o fato de que as regulamentações existentes são em si um remanescente do desprezo pelas mulheres, cujo corpo constituía um objeto pertencente ao homem. Estaríamos hoje muito longe disso? O Sr. von Krafft-Ebing bem diz, em outra passagem, por exemplo, que o emprego do código penal prussiano é contraditório quando evoca o ponto de vista moral no que diz respeito a relações sexuais anormais entre homens. Ele pretende “proteger o estado moral da pessoa contra a sua própria imoralidade”, mas deixa que o paedicatio nas mulheres prossiga sem oposição. Este não é, nem moralmente nem esteticamente, superior ao paedicatio entre homens; pelo contrário, na maioria dos casos, é muito inferior. Uma vez concedido o amor masculino, o paedicatio se torna um complemento quase inevitável. Mas ninguém desejaria afirmar esse uso legal moral sobre o amor de um homem por uma mulher e o paedicatio feminino.
Por que a sociedade não intervém contra esses e outros abusos do corpo feminino? Não é ignorância. Nada diremos sobre o que acontece naqueles casamentos que se limitam a dois filhos mas, a título de exemplo, faremos menção à prostituição feminina. Tudo é permitido com o corpo de uma prostituta, salvo a violência física brutal. Aquelas considerações sobre a não-invasão dos mistérios da vida matrimonial não prevalecem aqui. O Estado supervisiona a vida pública da prostituta e resguarda o seu estado de saúde – melhor dito, o estado de saúde de seus órgãos sexuais. O Estado não está preocupado com o que faz o homem que compra o seu corpo; exceto com que não a infecte com uma doença sexual, caso em que o Estado a isola.
Se, porém, a liberdade contratual entre homem e mulher é tão grande, a ponto de ser legítimo qualquer prazer sexual pelo qual ela vende o seu corpo, então não há uma fundamentação razoável com que punir criminalmente um contrato semelhante entre dois homens. Todas as autoridades médicas declaram que o paedicatio, que de fato ocorre em pouquíssimas instâncias do amor masculino, é fisicamente não-objetável. Portanto, apenas os efeitos sobre a moral dos praticantes é que entram em consideração. Mas todas as autoridades em direito criminal concordam que o Estado e a legislação criminal não controlam, e não poderiam controlar, a moralidade. Um breve vislumbre de até onde semelhante tentativa nos levaria nos convence de sua impossibilidade. Na realidade, já basta que a lei proteja o crescimento da nova geração do sexo masculino, como faz na França. Enquanto o corpo feminino permanecer fora do âmbito da lei, não existe argumento para justificar a punição criminal do amor masculino. Semelhante argumento ainda não foi criado, pois aquilo que ocorre diariamente nos bordéis e ninhos de prostituição, debaixo dos olhos da polícia, é visto como menos pernicioso para os padrões morais, do que a participação no amor masculino. Na maioria dos países, os parágrafos em questão permanecem no papel em noventa e nove de cada cem casos, sendo que no centésimo servem de subsídio para a atividade altamente moral do suborno. Berlim, em particular, teve experiência com isso e um dos legados prussianos é o parágrafo relevante no código legal imperial. Nos países em que regulamentações criminais relevantes foram eliminadas, não consta nenhum desejo de sua reincorporação.
Fica assim reduzido o lado legal da questão. Resta apenas considerar como a opinião pública deve ver os casos de amor masculino, como deve considerá-lo moralmente. O Sr. von Krafft-Ebing, cujo livro constitui um apelo pela anulação do parágrafo relevante do código penal austríaco, defende que se adote uma visão predominantemente patológica. O mesmo vale para a maioria dos psiquiatras. Em todo caso, pode-se no mínimo dizer que de forma alguma o amor masculino será sempre o sinal de uma tendência pervertida, depravada, de uma busca de prazer bestial ou coisa do tipo. Aqueles que imediatamente avançam semelhantes epítetos aceitam o ponto de vista das leis criminais reacionárias, defendidas pelos seus próprios formuladores através de referências aos preconceitos populares existentes e que supostamente deveriam ser levados em consideração. Pelo contrário, dever-se-ia avaliar, em cada caso separadamente, se porventura se trata de um caso de dissoluta licenciosidade ou de amor insuperável pelo mesmo sexo, o que não deve ser julgado moralmente, mas patologicamente.
Por outro lado, é necessário atentar para as explanações patológicas exageradas. Em última instância, qualquer coisa pode ser apresentada como sendo uma compulsão patológica e são precisamente os assuntos sexuais que fornecem o melhor campo para isso. No reino animal, não se constata, nos períodos de reprodução, estado anormal, patológico ou psicótico nos animais? Mas, mesmo que a vida sexual dos humanos apresente analogias com aquela, a atividade sexual humana é influenciada por outros fatores além do excitamento sexual, como as sensações momentâneas: opinião pública, hábitos estabelecidos e o que pensa o indivíduo que está correto; tudo influencia o desejo e as ações e pelo menos as pessoas envolvidas assim terão a possibilidade de reagir a tais práticas de prazer sexual que levam ao seu enfraquecimento psíquico, mental e moral.
Isso praticamente encerra o que hoje podemos dizer. Enquanto prevalecerem as condições sociais que, pode-se dizer, ameaçam punir o prazer sexual natural; enquanto todo o nosso modo de vida ferir constantemente os requisitos de saúde do corpo e do espírito; então a relação sexual anormal não desaparecerá. Pelo contrário, revelará uma tendência a se tornar o normal.